Um a um, eles encostam as pernas mecânicas no banco de reservas e se arrastam em direção à quadra, onde dão início ao aquecimento. São jogadores de vôlei paraolímpico da equipe Cruz de Malta, que veio jogar contra o meu time no Sesc Consolação. Nós: cerca de quinze elementos neuróticos que reclamam o tempo todo de dor nas juntas, preguiça e unhas lascadas. Eles: 14 atletas com membros inferiores amputados ou deficiência locomotora (sequelas de poliomelite, por exemplo). Meu próprio histórico não era animador: anos atrás, perdi uma partida de xadrez para um deficiente visual.
A principal regra do voleibol paraolímpico sentado é a chamada “bunda no chão”, ou seja, o atleta não pode tirar os glúteos da quadra ou, em caso de peixinhos mais ousados, o tórax. Só na hora da movimentação é que pode perder o contato para se deslocar com as mãos. Em relação à modalidade regular, a quadra é um pouco menor (10 por 6 metros) e a rede é baixa: na categoria masculina, fica a 1,15m do solo, pouco acima da altura oficial da rede de tênis. Em geral, o esquema é 4×2 (quatro atacantes e dois levantadores) ou até 3×3, devido à dificuldade em infiltrar dentro da quadra.
O aquecimento é intenso e meu time começa a passar vergonha. No vôlei adaptado, o fundamento principal é o toque (sentado, fica mais difícil encaixar a manchete), mas as bolas de ataque são furiosas e às vezes é preciso proteger a própria vida. Eles nos ensinam a manter as pernas pra frente, e não cruzadas ou pra trás, e então percebemos que elas só atrapalham. Deslocar-se é difícil, pois é preciso se arrastar com as mãos antes de tocar na bola, o que provoca a ocorrência de cenas ridículas. Nosso técnico não ignora o vexame e tenta esconder o rosto da provação pública.
A rede baixa empolga alguns dos nossos: “É a primeira vez que eu consigo bloquear na vida!”, exclamou uma baixinha, extasiada. A diferença é que, no vôlei tradicional, pode-se compensar falta de altura com boa impulsão, ao passo que no vôlei sentado dá pra contar apenas com o biotipo ou, vá lá, a capacidade de se esticar bastante. Os baixinhos abrem os braços, indignados. Quanta discriminação.
Agora os times já se misturaram e nosso objetivo maior é silenciar os apupos da arquibancada, seguindo as dicas de um sujeito que consegue dar bicicletas, como no futebol, sem ter as duas pernas. “É pra se mexer!”, eles gritam, perdendo a paciência e nos comparando a joões-bobos. O resultado é patético. Perdemos em todas as instâncias, menos na abundância de manchas roxas. E também trapaceamos: no fim do jogo, um dos nossos tenta se apoiar matreiramente no joelho para apanhar uma bola. Eles dão uma bronca: “Isso não pode fazer, né? Sem pernas, você cai de cara”. Nosso técnico sai de fininho e, desconsolado, pensa seriamente em mudar para o futebol.
[…] mais legal do dia, porém foi assistir Sitting Volleyball. Eu já tinha gostado de ir assistir as partidas de vôlei indoor durante as Olimpíadas e foi […]