Em 13 de março, comemorou-se no mundo inteiro o Dia do Número Pi. Quem perdeu a oportunidade de idolatrar essa curiosa constante matemática não precisa se desesperar: este ano ainda teremos o Dia do Aço, o Dia da Estrada de Rodagem, o Dia do Disco Voador, o Dia do Protético e, por fim, o Dia do Protesto, em 14 de agosto. Convém já ir planejando. Será uma boa oportunidade de ir a campo, subir num caixote e se irritar com alguma instância do cotidiano, como a violência, a poluição ambiental, o urso panda e a dieta de baixas calorias. Quem tiver uma mesa, que dê um soco vigoroso no móvel. Impropérios de toda sorte estão liberados nesse dia, bem como cartazes com palavras de ordem e manifestações rancorosas em frente a órgãos públicos.
Entre os protestos mais ilustres da história, temos o dia de jogar chá no mar – a Festa do Chá de Boston –, e o momento de atirar sapatos no presidente. Não podemos esquecer de Robert Opal que, em 1974, correu pelado no palco da cerimônia do Oscar, e do neozelandês que abaixou as calças diante do príncipe Charles e da princesa Diana. Os manifestantes mais simpáticos, porém, são belgas e promovem ataques de torta doce a celebridades como Bill Gates e Marguerite Duras. Costumam utilizar tortas de creme de ovo quando o alvo é móvel, tortas-merengue de limão para ataques bruscos e tortas de creme de tofu contra economistas. Igualmente dignos de nota são aqueles que se reuniram em torno do Pentágono, em 1967, e concentraram esforços para fazer o prédio levitar. Ou o grupo de cariocas que saiu às ruas com um penico na cabeça, no protesto “Chega de cocô”. Uma simpatia especial é reservada à Frente de Libertação das Barbies, que substituiu os chips de voz de bonecos da série Comandos em Ação e de bonecas Barbie; as meninas compravam Barbies que diziam “A vingança é minha!” e os meninos ganhavam soldados que gritavam “Vamos planejar nosso lindo casamento!”. (Mais sugestões edificantes podem ser encontradas na dissertação de mestrado de Érico Assis, “Táticas lúdico-midiáticas no ativismo político contemporâneo”, disponível na internet.)
Eu, particularmente, aprecio protestos em que ninguém sabe bem o que está fazendo. São as chamadas caminhadas em grupo. Nelas, alguém pode gritar, sem motivo: “Fora, lumbago! Saia já daqui”, e ser estrondosamente seguido por uma multidão de militantes. Um rapaz com cinto de tachas já providenciaria o cartaz: “Fora, lumbago” e a procissão se dirigiria automaticamente a Brasília, com o propósito de pôr fim à bancada lobista pró-ciática. “E eu que só saí de casa para comprar broas”, diria uma senhora, pega de surpresa pelo fluxo de caminhantes, mas já pronta a dar entrevista às redes de tevê.
Contudo, não há necessidade de ter ideias ou executar ações para protestar. É possível apenas falar, como fez o francês Lluis Colet por 124 horas seguidas, embora seu discurso tenha se perdido no caminho e desandado numa palestra sobre Salvador Dalí e a cultura catalã. Outro exemplo que pode servir de inspiração é o púlpito de um programa de tevê que passa nas madrugadas de sábado, no qual Rubinho Barrichello já reclamou de ser míope e insone, uma atriz declarou que “aniversário que é aniversário tem que ter brigadeiro” e os adolescentes protestam contra a fila da cantina e o imperialismo americano. Num momento memorável, um rapaz chamado Vitor subiu à tribuna e esbravejou: “Eu protesto contra a cirurgia plástica porque eu operei o nariz e ainda sou narigudo”. Em seguida, um outro cidadão decidiu protestar contra “quem ainda acha que pum não é cultura”. Fica aí a sugestão.