Folha de S. Paulo – Ilustrada
26 de dezembro de 2011
por Vanessa Barbara
Fim de ano sem retrospectiva na TV é como prova de hipismo nas Olimpíadas: não tem graça. Desde aproximadamente setembro estamos aguardando uma boa recapitulação dos eventos do ano, ansiosos por seu término, e a pioneira foi a da RedeTV!, com sua “Retrospectiva 2011” exibida no dia 18. Acompanhei a edição do programa disponível no site.
Com uma hora de duração, o especial até que fez um apanhado razoável dos fatos jornalísticos do ano. Foi longo e falou de diversas áreas: os protestos no mundo árabe, o terremoto no Japão, as mortes de Bin Laden e Muanmar Kadafi, as tragédias provocadas pelas chuvas, o Rock in Rio e a queda sucessiva de ministros.
Nos intervalos, “como não poderia deixar de ser”, temas pitorescos como a morte do urso polar Knut, a multa aplicada em noivas atrasadas e um homem pelado andando pelas ruas de Nova Mutum. (A expressão entre aspas é uma das mais intrigantes do nosso tolicionário, voltarei a ela em outra ocasião.)
Só houve um problema: o roteiro foi gerado automaticamente por um ciborgue, de posse do livro “O Pai dos Burros” (Humberto Werneck, Arquipélago Editorial, 2009), uma compilação de lugares-comuns e frases feitas do nosso léxico.
Está tudo lá: no especial, fala-se em “morte e destruição”, “solo tupiniquim” e “carnaval brazuca”. Invoca-se uma tal “face devastadora da natureza, com suas marcas e cicatrizes”.
Sem constrangimento, as repórteres ultramaquiadas fazem caras e bocas, mas no fundo parecem não prestar atenção ao texto: o importante é dar ênfase. “É o trânsito em sinal de alerta”, exclamam. E emendam uma série de trocadilhos deprimentes: o ex-ministro da Agricultura teve uma colheita infeliz, o dos Transportes saiu dos trilhos, o do Trabalho entrou para as estatísticas de desemprego e o de Turismo carimbou o passaporte para fora do governo.
Por que a televisão precisa ser sempre tão engraçadinha e enchoiriçada?
Amy Winehouse “vai embora assim como invade o Planeta Sucesso: fugaz demais” [sic]. Ainda assim, ela “ecoa viva por todos os quadrantes do Planeta Música”.
O mais constrangedor é o segmento sobre as obras da Copa-2014: “Por enquanto não há jogadores e nem torcedores. Os donos da bola são estes operários, que de Norte a Sul correm contra o relógio para mostrar uma Copa com cara e jeito do país do futebol”. Só aí, foram cinco clichês.
E o ano ainda não acabou.