Folha de S.Paulo – Imóveis
12 de junho de 2012
(Especial Dia dos Namorados)
por Vanessa Barbara
A grande desvantagem da coabitação romântica em caráter permanente tem a ver com o comprimento médio das unhas dos pés dos envolvidos: quando seu amor vive na mesma casa que você, poucas são as chances de manter o asseio ungueal com a mesma excelência e desenvoltura – a não ser que você volte mais cedo do trabalho ou se tranque no banheiro com a tesourinha, num contorcionismo constrangedor.
O mesmo ocorre com outras necessidades excretoras da biologia humana, sobretudo as regulares como a caca de nariz e a tosse com pigarro.
Trata-se do teorema da antiprivacidade cinética – não se pode ter micose em paz quando é preciso habitar com outrem em regime de intimidade total. Não se pode desenvolver costumes ridículos em sua própria sala, como praticar o bambolê e andar de cuecas ostensivamente, falando sozinho, a menos que o relacionamento já tenha passado dos dez anos.
Morando com o ente querido não há para onde correr em caso de discussão séria, piada ruim ou azedume. Você pode descobrir, numa manhã chuvosa de terça-feira, que o seu eleito mexe o copo de Nescau com um vigor irritante e solta um ronquinho pelo nariz quando ri. Isso pode ser bom ou completamente desastroso.
Há casos de separação motivados por um trocadilho infeliz, que foi evoluindo para reclamações sobre a tampa da privada, a toalha úmida na cama e, por fim, o tufo de cabelos fossilizado no sabonete. Mesmo o relacionamento mais estável pode desmoronar quando ninguém se digna a trocar as lâmpadas ou passar o domingo reforçando o reboque – literalmente.
Mas há vantagens de morar junto com um consorte: a primeira delas é não ter que voltar pra casa. A segunda se relaciona à mão de obra para abrir potes de conserva (embora o porteiro também possa servir) e pés quentinhos para as noites de inverno (deixe o porteiro fora disso).
Ter companhia para lanches da madrugada, cochilos vespertinos e um chinelo maior com que matar baratas também é vantajoso, mas convém escolher um pretendente complementar em prendas domésticas: por exemplo, alguém que goste de cozinhar se você prefere lavar a louça, alguém que empreenda uma massagem enquanto você costura, ou alguém que simplesmente saiba fazer algo útil, como um eletricista, encanador, carpinteiro ou dedetizador.
A despeito das dificuldades, nada melhor do que chegar em casa e encontrar a luz acesa, uma cebola queimando no fogão e alguém muito querido trancado no banheiro cortando as unhas do dedão.
Esta coabitação é muito boa e nada fácil:
– Muito boa se cada ser tiver seu próprio receptáculo de excrementos (vulgo banheiro) e nada fácil ter que ceder 80% do closet que era só seu;
– Muito bom dividir um pacote de pipoca de microondas assistindo “A Rena do Nariz Vermelho” e nada fácil ter que assistir ao clássico Portuguesa Santista x Matonense no Canal Vida na cozinha só para liberar a sala de tv com home theater para sua cara metade que não pode perder a novela;
– Muito bom dormir de conchinha e nada fácil acordar de madrugada quando a conha grunhe…. Isto dá outra crônica…