Por que o Mandaqui está virando um reduto sem mandaquienses
Folha de S.Paulo – DNA paulistano
2 de setembro de 2012
por Vanessa Barbara
Encravado entre os bairros de Santana, Imirim e Tremembé, o Mandaqui é uma espécie de Brooklin da Zona Norte. Ou melhor: uma mistura de Brooklin, Santa Cecília e Júpiter. (É distante, divertido, inacessível e aqui o celular não pega tão bem.)
O Mandaqui se localiza a 10 km do centro. Em dias normais, são 40 minutos de ônibus até a praça da Sé e uma hora e meia até a avenida Paulista. Aqui as ruas são íngremes, há muitas ladeiras e poucas calçadas em situação decente. Há casas térreas e moradores antigos, os vizinhos se conhecem relativamente bem e os cachorros andam soltos por aí, com seus nomes de gente. (O Menelau era o meu preferido.)
Mas mesmo o Mandaqui tem mudado. Cada vez menos se vêem nativos nas ruas, andando para ir ao seu Décio (a farmácia) ou ao Roberto (dono da ótica no comecinho da avenida Santa Inês). Os mandaquienses, que vergonha, aderiram em massa aos seus possantes, automóveis lustrosos e tunados com que fazem todo tipo de tarefa cotidiana. Hoje em dia, há provavelmente mais automóveis do que mandaquienses. E mais estacionamentos do que parques.
É, sem dúvida, um dos bairros paulistanos que mais sofrem com essa estúpida valorização do carro que está matando a cidade: com o transporte público cada vez pior, mais demorado e mais cheio, todo mundo se acha no direito de ter um carro. E é cada vez mais difícil viver no Mandaqui, com ou sem carta de motorista.
Percorrer a avenida Voluntários da Pátria, por exemplo, saindo de Santana em direção ao bairro, é um exercício de amor à vida. Em dias calmos, o percurso de 4 km leva menos de 15 minutos, com o vento batendo na cara quando se está no banco alto do coletivo. Experimente fazer esse trajeto em dias úteis ou em horário de pico: só no trecho entre o terminal de ônibus e o supermercado Pastorinho você pode levar meia hora, espremido atrás de uma fila de carros numa estanque quermesse local. Não há corredores de ônibus e nem metrô próximo (o mais perto é o Jardim São Paulo, mas não há linhas pra lá, só uma lotação que passa na Zumkeller).
Cresci jogando bola na rua, e hoje em vez de mandaquienses, parques, bicicletas, clubes e campinhos, há funilarias, concessionárias e fumaça de escapamento.
Pq diabos tem uma tartaruga comendo um morango ali em cima?