É couve no dente
#089 – São Paulo, 7 de setembro de 2012
Edição olímpica
Vida de tocha é fogo
www.hortifruti.org
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“É de onde não se espera nada que não sai coisa alguma.”
(Barão de Itararé)
“Só eu e meu pai, naquela casa, é que compreendíamos os tomates.”
(Samuel Beckett, Primeiro Amor)
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:: EDITORIAL ::
Como é largamente sabido pela comunidade hortifrutigranjeira, esta Hortaliça foi convidada por um grande conglomerado da mídia a cobrir a Olimpíada de Londres, de 27 de julho a 13 de agosto do corrente, ao que decidimos aproveitar a oportunidade para coletar ainda mais dados estratégicos desses povos excêntricos e irrelevantes que ainda não se dobraram à dominação colonizadora da Força Expedicionária Mandaquiense.
Reunimos, nesta edição, algumas das observações etnográficas que ficaram de fora da cobertura oficial do evento. Esta pode ser vista em http://www.hortifruti.org/category/cronicas/folha/londres-2012.
Por hoje é só.
:: HAIKAI: REGRAS DA CASA ::
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Seja amigável
Converse com o dono da casa
Trate bem o pássaro
:: NOTÍCIAS DOS JOGOS OLÍMPICOS DE 2064 ::
Cortesia de Marcos Barbará
– Medalha de ouro no judô, robô naturalizado japonês se emociona ao lembrar de engenheiro que o fabricou
– Chinês de 7 anos bate recorde dos 400 metros medley nadando os quatro estilos simultaneamente
– Ronaldinhozinho fracassa em levar o Brasil ao primeiro ouro olímpico no futebol
– Australásia do Sul perde para o Reino da Venezuela na lambada esportiva
– Romeno muda de sexo duas vezes durante os Jogos e ganha ouros no arremesso de peso masculino e feminino
– Sob a batuta de Clébernylson, Brasil garante medalha no Guitar Hero
– Estreando novo cérebro artificial, rainha Elizabeth participa de cerimônia de abertura
:: AMSTERDÃ, 1928 ::
O australiano temente ao pato
O australiano Henry Pearce disputava as quartas-de-final no remo skiff simples contra o francês Victor Saurin. No meio da prova, Pearce estava um pouco à frente quando se deparou com uma família de patinhos cruzando perigosamente sua raia. Sem hesitar, o australiano abandonou sua busca pela glória olímpica para permitir que Mamãe Pato e seus patinhos nadassem em fila indiana até a outra margem, de forma despreocupada e tranquila.
Ao término da travessia, ele conseguiu retomar o ritmo e vencer a prova, classificando-se para a semifinal, a qual também ganharia, a exemplo da final, conquistando a medalha de ouro para alegria dos humanos e dos ovíparos.
:: ESTOCOLMO, 1912 ::
O japonês que mudou de ideia
Fazia um calor incomum na Suécia durante os Jogos de 1912, e para piorar, a prova mais desgastante, a maratona, começava ao meio-dia. Dentre os competidores estava o japonês Shizo Kanaguri, um dos primeiros asiáticos a competir em uma Olimpíada. Ao fim da primeira metade da prova, muitos competidores já tinham desistido por conta do calor, mas Kanaguri resistia heroicamente, ainda que tenha deitado no percurso por duas vezes. Ao passar por um bosque, o japonês se deparou com uma família sueca fazendo um animado piquenique naquele domingo glorioso. Convidado a se unir a eles, não foi necessário um segundo pedido para convencer Kanaguri, que aceitou a generosa oferta e bebeu suco de framboesa até pegar no sono. Ao acordar, percebeu que era muito tarde para retomar a corrida, então pegou um trem direto ao porto, onde, envergonhado, decidiu não contar a ninguém o que tinha acontecido, retornando de volta ao Japão.
Após a corrida, a organização localizou os 33 corredores que não haviam terminado a prova – exceto Shizo Kanaguri, que foi dado como desaparecido. A situação se tornou uma anedota popular na Suécia, onde se usava o nome do japonês para denotar algo que havia sumido sem explicação.
Em 1962, no 50º aniversário dos Jogos, um jornalista sueco foi ao Japão tentar descobrir pistas sobre o paradeiro de Kanaguri. Eis que o japonês é encontrado dando aula de geografia na cidade de Tamana. Kanaguri não tinha ideia que ele era uma celebridade na Suécia e cinco anos depois, aos 76 anos de idade, foi contratado para a inauguração de uma loja de departamentos em Estocolmo. De lá foi caminhando até o Estádio Olímpico, onde, para o delírio dos suecos, correu até a linha de chegada, completando a maratona que havia iniciado 55 anos antes.
:: SEMELHANÇAS ENTRE A VILA OLÍMPICA E A VILA OLÍMPIA ::
– Ambas são de difícil acesso
– De dia todo mundo trabalha, à noite todo mundo bebe
– Há muitos seguranças barrando a entrada de mandaquienses
– Ambas são artificiais
– E muito caras
– Você só pode ver de longe, e uma vez a cada quatro anos
– Tem que levar lanche de casa
– Impossível arrumar um apartamento por lá
:: CONSELHO DE CAMPEÃO ::
Cortesia de Michael Phelps
Tudo bem fazer xixi na piscina. Todo mundo faz.
:: 200 M RASOS NO MOONWALKING ::
Cortesia de Paulo Henrique Martins
É preciso entender que certas atitudes drásticas são justificáveis dentro de um contexto. Jim Lee havia viajado vários dias de trem, de Myanmar até Londres, somente para poder desfrutar do ambiente do Parque Olímpico. Depois de ter ido a Pequim quatro anos atrás, ele precisava ver o que Londres havia aprontado dessa vez.
Foi, portanto, compreensível a decepção de Jim Lee ao chegar em Stratford e ver que as entradas para visitar o Parque Olímpico não estavam mais disponíveis à venda; só visitava a região quem tivesse ingressos para ver as competições. Jim Lee se esforçou: tentou comprá-los, mas já não restava nenhum disponível. Passou horas na frente da estação com um cartaz avisando que queria ingressos – e pagava bem por eles, mas foi alertado pela polícia que era uma prática ilegal e ele poderia ser preso. Voltar para casa sem ter entrado no Parque Olímpico seria uma decepção sem tamanho.
Naquela sexta-feira, Jim Lee tomou uma atitude drástica. Foi até Stratford e posicionou-se de costas ao portão de saída do Parque Olímpico. Encarando a fonte do shopping Westfield, Jim Lee começou a sentir as pessoas passando por ele, aqueles que haviam assistido às primeiras provas do dia, saindo do Parque em bando. Sem olhar pra trás, começou a fazer o moonwalking.
Os seguranças a princípio estranharam. Parecia que alguém vinha em direção ao Parque Olímpico, mas não fazia sentido: a pessoa estava de costas e andava para frente. Provavelmente estaria saindo. Não? Um deles, desesperado, puxou da mochila o manual de regras que havia recebido para tomar conta daquela saída. Ele deveria barrar todo mundo que tentasse entrar pela saída, mas aquele homem parecia estar saindo pela saída, só que ao contrário. Junto com outro voluntário, viravam páginas desesperadamente procurando instruções sobre como proceder naquela situação. Enquanto isso, Jim Lee, andando para frente e indo para trás, passava com naturalidade pela linha de pessoas de camisa magenta, e o público que saía do Parque Olímpico desviava dele.
Assim ele foi indo. Em pouco tempo, ultrapassou os portões. Começou a cruzar a ponte que levava e trazia transeuntes, só que a cruzou pelo lado contrário, mas virado para o lado certo, só que andando na contramão. Ou algo assim. Passou por baixo de uma placa com um letreiro que, pelo que ele podia ler, agradecia a visita ao Parque Olímpico. Mais à frente, virou à direita e pôde ver o Orbit em frente, o grande estádio olímpico à sua esquerda e a multidão andando ainda em todos os sentidos. Jim Lee havia entrado.
A visita do rapaz, entretanto, poderia ser mais agradável. Em nenhum momento Jim Lee se sentiu seguro o suficiente para abandonar o moonwalking e voltar a andar normalmente. Quando saiu do Parque Olímpico pela entrada, leu o aviso de “Bem-Vindo” e passou pelos detectores de metais sem ter a mala devidamente vistoriada. Foi acusado de furar fila ao contrário e só parou quando a catraca do metrô lhe impediu de continuar andando para trás.
:: ATRIBUÍDO A ::
Winston Churchill
Não se ganha uma guerra com alface nos dentes.
:: COISAS DA INGLATERRA ::
Da Seleções do Reader’s Digest, maio de 1965
Há muitos anos, a relutância dos marinheiros em navegarem às sextas-feiras atingia tais proporções que o Govêrno Inglês resolveu provar a falácia da superstição. Iniciaram a construção de um navio numa sexta-feira, lançaram-no ao mar em outra sexta-feira, denominaram-no H. M. S. Friday (sexta-feira), e fez-se ao mar numa sexta-feira.
O plano teve apenas um inconveniente: nunca mais se ouviu falar do navio nem da tripulação.
— Our Navy
Recentemente, o Rev. Michael Newman e outras cinquenta pessoas caminharam dez quilômetros e subiram trezentos metros até Dartmoor para um serviço religioso de madrugada. Alguém perguntou ao reverendo por quê, e ele explicou:
– Estávamos revivendo um velho costume, mas ninguém se lembra exatamente qual.
— Quote
:: POR DIVERSÃO ::
Time Out, 9-15 de agosto de 2012
Você sabia?
Londres tem sua própria força voluntária de informações sobre ônibus noturnos
Todas as sextas e sábados à noite, há um sujeito que fica sentado no ponto da Trafalgar Square fornecendo informações impecáveis aos bêbados sobre os ônibus noturnos. Ele não cobra nada e não é contratado por ninguém. Só faz isso por diversão.
:: A CADA DEZ SEGUNDOS ::
Sam Levenson
Somewhere on this globe, every ten seconds, there is a woman giving birth to a child. She must be found and stopped.
[Em algum ponto do planeta, a cada dez segundos, uma mulher dá à luz uma criança. Precisamos encontrá-la e detê-la.]
:: HISTORINHA ::
No trem para Cardiff, um brasileiro gritava ao celular: “Alô? Só pra avisar que consegui os ingressos. Queria agradecer por ter procurado pra mim. Hoje cedo achei que não ia conseguir… Mas arrumei os ingressos, Neymar, obrigado.”
:: THE EMPTY SEAT @OLYMPIC SEAT ::
Time Out, 9-15 de agosto de 2012
Esta semana, ele alcançou 20 mil seguidores, mas ainda não logrou abrigar um só traseiro.
@Assento_Vazio: Minha mãe queria que eu seguisse uma carreira mais estável, como por exemplo tornar-me uma cadeira da Ikea. Mas achei que estava destinado a algo maior.
@Assento_Vazio: Esperei sete anos por esse momento. Sete anos, e pra quê?
@Assento_Vazio: Estou me sentindo um fracasso.
:: BRIAN, O POMBO ::
Time Out, 9-15 de agosto de 2012
Um relatório semanal do nosso correspondente olímpico aviário, que está literalmente cobrindo os Jogos Olímpicos de 2012, em Londres
Quase tão rápido quanto começou, já está quase no fim. Não acho que já vi duas semanas passarem tão rápido. E olha que chacoalhei meu traseiro gordo por toda parte. Voei de Soho até Stratford, depois pela M4 até Eton Dorney, então voltei pela M40 até Wembley. Tem sido incrível. Uma das melhores coisas é flanar pelos shows gratuitos no Hyde Park. Esse chão coberto de serragem foi um toque de gênio. Nada como mascar um naco de serragem úmida para animar o dia. Também nunca vi tantos carrinhos de comida. Macarrão, curry, batatas fritas, salsichas, cerveja. Há todo tipo de comida que você pode imaginar, e os comensais estão sempre sentados no chão vendo esportes no telão. Batatas e salgadinhos voando por toda parte. Pombos de todas as procedências estão vindo se juntar à festa. Trombei com um casal de Birmingham que veio para acompanhar o basquete. O melhor lugar é geralmente nos bastidores: cheio de gente desperdiçando canapés por cima dos ombros. Aqui não. Os bastidores vivem vazios. Curti a tarde com Sophie Ellis-Bextor e o The Feeling, antes do show de semana passada. Quando digo que “curti”, quer dizer que cisquei por baixo da mesa e fiquei lá por um tempo. Ainda assim, estive perto o suficiente e dei uma porção de rasantes quando eles tocaram naquela noite. Só foi esquisito quando fiz cocô sem querer na cabeça do Johnny Vaughan justo quando ele concluía seu show, transmitido ao vivo pela Absolute Radio. Decerto a última coisa de que ele precisava. Johnny, se você estiver lendo isto: foi mal, cara. Não tive a intenção. Apenas escapou.
:: ENCRENQUEIRO ZÉ COLMÉIA É FERIDO EM ACIDENTE DE TREM ::
Metro (Londres), 3 de maio de 2012
Um legítimo urso Zé Colméia que prefere roubar comida a sair para caçar está em situação crítica após ser atropelado por um trem. O urso mal teve tempo de deixar as manchetes desde que acordou de seu período de hibernação este ano: primeiro, foi acusado de assaltar lixeiras e cutucar colméias na Áustria e na Suíça.
Depois, o animal microchipado largou um carrinho de neve após utilizá-lo para afiar suas garras e, na semana passada, usou um poste de luz como coçador de costas, provocando um incêndio florestal. Agora, ao que tudo indica, está ferido e escondeu-se numa caverna após ter sido atropelado por um trem entre as cidades de Scuol e Klosters, na Suíça.
O urso, chamado de M13 pelos especialistas, perdeu o irmão M14 no mês passado, atropelado por um carro na Itália.
:: A GRANDE FUGA DE HOUDINI ::
Com informações da BBC, em 1 de maio de 2012, e do Metro, 3 de maio de 2012
Um hamster em fuga causou a seus donos um prejuízo de mil libras após abrir caminho mascando os fios elétricos do carro da família. Apropriadamente chamado de Houdini, o rato alcançou o motor durante uma viagem em que seria levado para sua nova residência, em Micklover, Derbyshire, numa caixa de papelão. Foi localizado e recuperado pelo Automóvel Clube depois de uma busca de duas horas no Passat. “Tivemos que desmantelar o carro. Tiramos o porta-luvas e o volante, então o homem do Automóvel Clube lançou um facho de luz com a lanterna por trás do rádio e gritou: ‘Acho que posso vê-lo!'”. Então abriram o capô e, quando surgiu a cabecinha de Houdini, o retiramos de lá.
“Ele parecia indiferente à comoção”, declarou a proprietária, Victoria Cooper.
Não foi o fim da aventura, já que, no dia seguinte, Houdini teve de ser resgatado da mandíbula do gato da família.
O hamster custou 7 libras num pet shop.
:: BÊBADOS PAGAM MULTA POR FURTAR PINGUIM ::
Metro (Londres), 3 de maio de 2012
Dois turistas bêbados que invadiram um parque temático e roubaram um pinguim chamado Dirk foram multados em mais de 600 libras.
Rhys Jones, 21, e Keri Mules, 21, naturais de Cardiff, também nadaram com golfinhos e entraram numa jaula de tubarões para acionar um extintor de incêndio. Mas, em vez de guardar segredo sobre suas façanhas, a dupla gabou-se no Facebook e foi denunciada à polícia de Brisbane, Austrália.
Eles beberam grandes quantidades de vodca numa festa e escalaram o portão do Sea World, em 14 de abril. Na manhã seguinte, acordaram no apartamento ao lado de Dirk, um pinguim de sete anos.
Jones e Mules tiraram fotos e fizeram vídeos do animal antes de liberá-lo num canal da região. Ele foi visto por um passante e resgatado pelo Sea World.
Os galeses se declararam culpados por invasão, furto e captura de animal selvagem. O juiz Brian Kucks recomendou à dupla: “Da próxima vez que estiverem numa festa, deviam considerar beber um pouco menos de vodca”.
:: MELHOR PONTO DE VISTA JORNALÍSTICO ::
Evening Standard, 4 de maio de 2012
Título da matéria: Ken planeja cuidar de jardim enquanto sua campanha se prepara para a derrota
Ken Livingstone declarou hoje que pretende praticar um bocado de jardinagem, enquanto encara a possibilidade de derrota nas eleições municipais. O candidato do Partido Trabalhista declarou ao Standard que só espera que não chova este fim de semana. Fontes da campanha admitem que são baixas as chances de vitória para o ex-prefeito.
No quintal de sua casa em Cricklewood, Livingstone, 66, afirmou: “Meu futuro imediato não é diretamente afetado pela vitória ou pela derrota. Minha cunhada acaba de se mudar para uma nova casa e eu prometi que cuidaria de seu jardim neste feriado”.
“Espero que não chova. O canteiro está coberto de ervas daninhas e eu adoro cuidar disso”.
:: PROIBIDO TREPAR EM ÁRVORES E EMPINAR PIPAS ::
Evening Standard
Os administradores da subprefeitura de Enfield estão sendo chamados de estraga-prazeres após proibir as crianças de trepar em árvores e empinar pipas nos parques da região. Mais de 40 regras foram introduzidas no bairro, incluindo o veto à prática de aeromodelismo e skate de forma “irritante e perigosa”.
Adultos pegos no descumprimento da lei podem levar uma multa de 500 libras, enquanto crianças ficarão sujeitas às leis de comportamento antissocial, criadas para deter vândalos e vizinhos barulhentos. Dizem as normas: “A nenhum cidadão é permitido, sem desculpa razoável, subir numa árvore”.
Andar de bicicleta fora das vias específicas também é proibido. […] As pessoas estão sujeitas a multas por nadar em lagos, jogar golfe, “andar a cavalo de forma que prejudique os demais”, usar detector de metais ou andar de skate de forma “irritante” ou perigosa.
:: PESQUISA DE OPINIÃO ::
do Direct Matin
36% dos americanos acreditam na existência de extraterrestres, segundo uma pesquisa efetuada pelo National Geographic. E 65% dos entrevistados pensam que o presidente Obama se sairia melhor do que Mitt Romney, seu adversário republicano nas eleições presidenciais, na eventualidade de uma invasão alienígena.
(acima, nuvem com o formato da Grã Bretanha)
:: NUVENS QUE SE PARECEM COM OUTRAS COISAS ::
Metro (Londres), 3 de maio de 2012
Gavin Pretor-Pinney, 43, é fundador da Sociedade de Apreciação das Nuvens. Seu best-seller Guia do Observador de Nuvens foi publicado em 2007. Ele também é autor de Nuvens Que Se Parecem Com Outras Coisas.
Metro: A Sociedade de Apreciação das Nuvens possui quantos membros?
Gavin Pretor-Pinney: 29.534 associados e continua crescendo. É uma ideia que se espalhou de forma viral. As pessoas costumam observar nuvens quando crianças – olhando para o céu e identificando padrões – e, mesmo que hoje reclamem delas, o afeto ainda permanece. Nossa sociedade lembra às pessoas que as nuvens não precisam ser fontes de lamúria.
M: Há um perfil típico do associado?
GPP: Não. Já chegaram a comprar títulos de afiliação para bebês, e nosso membro mais idoso tem 96 anos. O perfil varia de físicos de nuvens a fotógrafos que apreciam o fenômeno por sua beleza estética. Não há um membro típico, embora nos vejamos como pessoas que enxergam a beleza no dia-a-dia.
M: Quais são os principais objetivos e atividades da sociedade?
GPP: Lembrar que não é preciso cruzar o mundo para encontrar o exótico. Há aspectos estonteantes de natureza à nossa volta, basta mudar ligeiramente a perspectiva. Seríamos mais felizes se não desejássemos sempre estar em outro lugar do mundo, um lugar sem nuvens no céu. Se apreciássemos essa beleza, seríamos mais felizes.
M: Por que você fundou a sociedade?
GPP: Foi numa palestra no festival de literatura de Cornwall, em 2004. Me pediram para fazer uma palestra sobre nuvens, mas fiquei com medo que ninguém aparecesse, então a chamei de “Palestra Inaugural da Sociedade de Apreciação de Nuvens”. Depois disso, as pessoas vieram pedir para se associar. Começou como uma piada, mas as melhores ideias surgem quando você está numa disposição leve e despreocupada.
M: Quais são as suas estatísticas preferidas sobre nuvens?
GPP: As gotas de água numa cumulus média, essas que têm consistência de lã e surgem nos dias de sol, têm o peso de oitenta elefantes. As gigantescas cumulus nimbus podem ter o dobro da altura do Everest.
:: GIRAFA’S ::
Entrevista com a atriz Joanna Lumley, 66, mais conhecida pelo papel de Patsy em Absolutely Fabulous. Ela diz que gostaria de reencarnar como uma girafa.
:: NOTAS BIOGRÁFICAS ::
Redigidas pelo meu irmão
1) Em meados de 1986, fomos todos a Itu e lá entramos no estádio do Ituano. Tem foto minha e sua com o Delei, reserva do Ituano que provavelmente nos deu o único autógrafo de sua vida esportiva.
2) Em 8 de janeiro de 1995, fui com o papai à Rua Javari e lá encontramos o Professor Pupo Gimenez, técnico dos juniores do Corinthians na época. Apesar do jogo não ser do Corinthians, era do mesmo grupo, o que motivou a frase do papai para o Professor Pupo Gimenez, que provavelmente não queria ser reconhecido: “SEU PUPO, VEIO VER OS ADVERSÁRIOS???” (aprox. 170 decibéis). O jogo era Juventus x Juventude, placar de 3-0 para o Juventus.
:: FRASES OUVIDAS ::
“Vai, Brasil! Tem que ganhar porque é o único ingresso que a gente tem.”
“Vai, vermelho!”
“Força, azul!” (Numa partida de vôlei de praia em que os dois lados eram alemães.)
:: VIDA DE TOCHA É FOGO ::
Temas esparsos desta Olimpíada
– BBC e sua transmissão Cléber-Machadiana: o locutor especialista em vôlei dessa reputadíssima emissora inglesa pareceu arrasado com a vitória do Brasil contra os Estados Unidos, na final do vôlei feminino. Durante o primeiro set (no qual as ianques ganharam de lavada, por 25×11), ele só faltava trazer a mãe para cumprimentá-las, empolgadíssimo com a performance americana e já botando terra em cima da tumba das adversárias. Em comentários deprimentes, observou que os pontos brasileiros “apenas adiavam o inevitável”, ou seja, a derrota, e ironizou qualquer ataque certeiro das meninas. Fez comentários pessoais sobre a habilidade de cada uma e ressaltou a superioridade inconteste das estrangeiras. Mas, ao que parece, as brasileiras devem ter ouvido a narração, porque voltaram com sangue nas órbitas.
A partir do segundo set, o time protagonizou uma bela virada, e o que se ouvia na locução da BBC eram longos minutos de silêncio. Durante os pontos finais, pouco antes do ouro brasileiro, parecia até que o locutor tinha ido embora. Ele ainda tentou se justificar por um tempo, quase atribuiu a recuperação brasileira a uma tática norte-americana ou a um milagre religioso, e então desistiu. Entregou a locução ao Senhor.
O mesmo aconteceu em outras partidas de vôlei. Ele parecia triste, macambúzio em suas narrações, verdadeiramente infeliz com as partidas. Cada ponto era apenas uma confirmação de sua lamentável visão de mundo, no que pareceu uma nova tática de locução da BBC, destinada a deprimir o espectador para que não saia de casa nunca mais e continue dando boas audiências à emissora.
– Usain Bolt costuma ir ao McDonald’s e pedir vinte nuggets antes de correr. Não consegui desenvolver essa informação. Só ficou a dúvida: qual seria o molho preferido do velocista?
– Onde é que a tocha dorme durante sua passagem pelo mundo?
– Por que a seleção búlgara de basquete estava caminhando pelo Parque Olímpico se a Bulgária não foi classificada para a modalidade? E mais: poderiam os bons resultados do país no vôlei ser atribuídos a ela?
:: ATÉ UM FILATELISTA ::
De um episódio da série Tatort
Você está começando a ficar paranoico, Moritz. Nós temos cristãos, ateus, muçulmanos, esotéricos. Um ou dois maçons. Temos até um filatelista!
:: BONGÔ! BONGÔ! ::
É hora de quebrar o silêncio da grande imprensa e revelar, em primeira mão, a melhor coisa da Olimpíada 2012: a pausa do bongô. Em poucas palavras, é o seguinte: no intervalo das partidas de basquete, entravam dançarinos apresentando coreografias de street dance. Ou uma equipe de corda chamada Get Tricky, que distraía o público com truques atléticos na arte de pular corda, rodopiando, saltitando em fileiras e trançando grossas cordas. No intervalo do vôlei de praia, meninas de biquíni com grandes bolas de plástico dançavam ao som de Beach Boys, numa das atrações mais cafonas dos Jogos.
No intervalo das partidas de vôlei, porém, era o Homem frente a frente com o Bongô. Um duelo de corações e mentes numa excêntrica simbiose. O apresentador pimpão e anedótico ficava ao microfone entretendo o público e levantando questões básicas da modalidade, numa inútil tentativa de ganhar tempo para o que realmente importava: o bongô. A certa altura, no telão, ele exibia um desenho do instrumento. Ao fundo, a trilha sonora. Pedia que a câmera desse closes em torcedores e, ao vivo, instava-os a batucar o instrumento imaginário – não houve quem saísse incólume da experiência, e devo confessar que assisti uma final única e exclusivamente por causa do bongô. Treinei em casa, inclusive. A alguns afortunados, o apresentador concedia palavras elogiosas como: “Claramente não é a sua primeira vez”, ou: “Você nasceu pra isso, cara!”. Quando a câmera focalizava uma senhora idosa, o povo ia ao delírio. Alguns chegavam a hesitar, desacostumados a passar vergonha dessa forma, mas a plateia urrava e o sujeito acabava cedendo. E com gosto: alguns batucavam cruzando as duas mãos, ou com a cabeça, outros ficavam de pé e sapateavam no tambor.
Um dos únicos a resistir foi uma celebridade do basquete inglês, um certo jogador que assistia seus compatriotas do vôlei e foi focalizado nos primeiros instantes do intervalo. Soberbo, não só resistiu ao apelo do bongô como virou-se de costas, recebendo um apupo instantâneo da multidão. Sua seleção perdeu vergonhosamente no dia seguinte, e dizem que foi culpa da arrogância perante o bongô.
Na foto acima, um anônimo cede ao desvario musical.
:: NOTÍCIA ::
“Tênis: No. 1 do mundo perde e ainda prende cabelo na raquete”.
Esse tipo de notícia me dá um senso de comunhão com a humanidade.
:: EU DURMO COMIGO ::
Angelica Freitas
eu durmo comigo/ de bruços deitada eu durmo comigo/ virada pra direita eu durmo comigo/ eu durmo comigo abraçada comigo/ não há noite tão longa em que não durma comigo/ como um trovador agarrado ao alaúde eu durmo comigo/ eu durmo comigo debaixo da noite estrelada/ eu durmo comigo enquanto os outros fazem aniversário/ eu durmo comigo às vezes de óculos/ e mesmo no escuro sei que estou dormindo comigo/ e quem quiser dormir comigo vai ter que dormir ao lado.
:: ANOTAÇÃO ESPARSA ::
Durante a Batalha de Poitiers (1356), o exército inglês fez um cerco para capturar João II, da França. Para se esconder, o monarca francês tirou suas túnicas reais, anéis e colares, e se misturou a multidão. Contudo, os soldados ingleses o capturaram sem dificuldades em poucos minutos. João II era a única pessoa que estava de coroa.
:: REPÚDIO AO COLEGA ::
Considerei bastante infeliz a observação do colega Antonio Prata em sua coluna na Folha no último dia 5 de agosto, na qual proclamou a corrida um esporte de fujões. Em sua tocante defesa do levantamento de peso, este sim um desporto notável, ele chega a falar de um mundo “decadente e esquálido, em que a virilidade escorreu pelo ralo”.
Deveria o chocarreiro escrivão refletir um pouco e considerar uma questão essencial: que esportes seriam realmente úteis na eventualidade de um apocalipse zumbi? Qual a serventia, afinal, do levantamento de peso diante de um ataque de mortos-vivos? E da marcha atlética, essa piada que deu certo?
Já o treinamento em atletismo, arco-e-flecha, tiro e arremesso de dardo seriam determinantes para a sobrevivência da humanidade e perpetuação da espécie.
:: MALLEUS MALEFICARUM ::
Colaboração de Adriano Marcato
[…] Caso semelhante é relatado por São Gregório em seu primeiro diálogo: uma freira que comeu alface sem ter antes feito o sinal da cruz foi depois liberada (da possessão demoníaca) pelo padre Equitius.
:: AS COISAS ::
Georges Perec
Assim viviam, eles e seus amigos, em seus pequenos apartamentos abarrotados e simpáticos, com seus passeios e seus filmes, seus grandes jantares fraternos, seus projetos maravilhosos. Não eram infelizes. Alguns prazeres de viver, furtivos, evanescentes, iluminavam seus dias. Certas noites, depois de jantar, hesitavam em se levantar da mesa; terminavam uma garrafa de vinho, beliscavam nozes, acendiam cigarros. Certas madrugadas, não conseguiam dormir e, meio sentados, recostados contra os travesseiros, um cinzeiro entre eles, conversavam até de manhã. Certos dias, passeavam batendo papo horas inteiras. […] Bastava estar ali, na rua, num dia de frio seco, de muito vento, bem agasalhados, no cair da tarde, se dirigindo sem pressa, mas em bom passo, a uma casa amiga, para que o menor de seus gestos — acender um cigarro, comprar um saquinho de castanhas assadas, se esgueirar no tumulto de uma saída de estação de trem – lhes parecesse a expressão evidente e imediata de uma felicidade inesgotável.
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Agradecimentos
Aos de sempre. Obrigada.
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“Para ser lido na maldita hora da noite em que tudo é engraçado — logo após a hora em que nada faz sentido e antes daquela em que tudo faz sentido” (Stephanie Avari, a moradora mais ilustre da rua Paulo da Silva Gordo) ## Você está recebendo !!Witzelsucht!! porque estava na mala direta. Ou então, ou então! Você está recebendo o !Rododendro! porque foi um dos 139 mil nomes escolhidos entre todos os possíveis, sorteados em uma grande urna chinesa. Você e o To Fu, que ganhou o direito de trazer um tufo de nenúfares e furar a fila. Caso não queira voltar a receber este jornalzinho, mande um e-mail para hortalica@gmail.com e diga na linha de assunto: “Foi demais para Kudno Mojesic”, mesmo que você não seja — e nem queira ser — Kudno Mojesic.
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