Folha de S.Paulo – Ilustrada
8 de outubro de 2012
por Vanessa Barbara
Meses atrás, em Londres, participei de um city tour desses em que os guias estimulam a participação popular com perguntas de conhecimento geral, testando a sabedoria da plebe em temas como a peste negra, o grande incêndio de 1666, a fragilidade sentimental da rainha Victória e o barril de rum com o cadáver do almirante Nelson.
Impressionado com minha fúria replicante e minha astúcia à la “Trivial Pursuit”, o guia veio perguntar onde foi que aprendi tantas coisas. Sem hesitar, respondi: “Pela televisão!”.
Juro que não estava exagerando. Naquele dia em específico, minha perspicácia se devia a episódios de “Doctor Who” (diferença entre Union Flag e Union Jack, esta última de uso marítimo), “Monty Python’s Flying Circus” (ninguém esperava a inquisição espanhola), “Caçadores de Mitos” (por que os piratas usam tapa-olhos), “Band of Brothers” (Segunda Guerra), “Inspetor Morse” (tudo o que sei sobre Oxford) e dois filmes que assisti na TV a cabo: “V de Vingança” (a conspiração de Guy Fawkes) e “Do inferno” (Jack, o Estripador).
À parte os programas educativos e documentários de ciência ou história, séries de ficção também podem ser fontes de conhecimento. A primeira vez que ouvi falar de efeito Coriolis foi num episódio de “Arquivo-X”. Foi nesse mesmo programa que aprendi sobre combustão espontânea e criaturas mutantes comedoras de fígado, mas isso não importa. O conteúdo pode ser simplista e distorcido, muitas vezes até errado, mas está lá, e é a partir dele que se dá o primeiro passo.
Em entrevista para a revista Serafina, o escritor Jonathan Franzen revelou: “Eu poderia aprender muito sobre metanfetamina na Wikipedia ou em outros sites. Mas é muito mais prazeroso assistir a ‘Breaking Bad’”.
Já no documentário “Como William Shatner Mudou o Mundo” (2005), cientistas comentam o papel que “Jornada nas Estrelas” teve em suas vidas. “A primeira vez que ouvi falar de propulsão a íons foi num episódio da série”, disse Mark D. Rayman, engenheiro da Nasa que veio a trabalhar na primeira missão espacial a usar essa tecnologia.
Conta-se que, em 1993, o físico Stephen Hawking fez uma visita ao cenário da série e comentou, diante de um núcleo de dobra da nave Enterprise: “Estou trabalhando nisso”.
Além do mais, conheço pelo menos uma pessoa que passou no vestibular da USP por causa de “O Mundo de Beakman”.
Coisas interessantes que aprendi no Arquivo X: Síndrome de Münchhausen, noções de lobotomia primitiva e o bizarríssimo e notabilíssimo caso das sereias Fiji.