Folha de S.Paulo – Ilustrada
25 de outubro de 2012
por Vanessa Barbara
Em plena segunda à tarde, encalhei no cinema do Shopping Frei Caneca durante quatro soníferas horas, pega de surpresa com o esgotamento dos ingressos de “Barbara” (2012, Alemanha). Diante da súbita preguiça de escolher um plano B (um filme turco, dois brasileiros, um francês, um israelense e um cazaque), fiquei esperando o início de outra sessão que acabou por não acontecer (“Tubarão”, 1975, EUA).
Sem Kindle na mochila e nem vontade de sair para comprar sapatos, fui parar no Scada Café, onde um sanduíche de rosbife custa 14,90 reais e a fila beirava a parede oposta dos caixas. Levei quinze minutos para mastigar cada naco de pão, cochilei, acordei, dormi de novo, fiz novos amigos, e o tempo não passava. Como numa pescaria.
Preferia ter ficado presa no pitoresco espaço Matilha Cultural (rua Rêgo Freitas, 542), onde há jardim, tabuleiro de xadrez e uma excelente biblioteca (vi um tratado sobre tulipas em meio a clássicos da literatura e um livro de poemas astrológicos).
Lá, as sessões da Mostra são gratuitas e cachorros são bem-vindos.
No Frei Caneca, como de hábito, a fila para as sessões mais concorridas se forma com meia hora de antecedência – num piscar de olhos, o que antes era vazio se transforma em aglomeração, e se você resolve amarrar os cadarços antes de aderir é capaz de só conseguir um lugar ao fundo, atrás do sujeito com pigarro.
Grupos de conversa se formaram e se dissolveram, ao nosso lado passou a fila inteira para o filme do Ken Loach, e nada de abrirem a sala. As cédulas de votação foram distribuídas, gerando certa inquietação – afinal, devemos marcar um “regular” ou “não gostei” para o clássico do Spielberg, na esperança de fazê-lo voltar no tempo e repensar “Hook” e “Amistad”?
Por fim, vieram avisar: “Não iremos exibir ‘O Tubarão’”. (Alguém sussurrou: será que vão substituir por “O Bacalhau”?) O arquivo digital em formato DCP não abriu, portanto seria veiculado o longa “Dom: Uma Família Russa”.
“É, não rolou…”, disse um rapaz da organização. “Vamos precisar de um barco maior”, eu pensei, arrastando meus barris amarelos para casa.