Folha de S.Paulo – Ilustrada
22 de abril de 2013
por Vanessa Barbara
Aquele momento em que acaba a luz no meio da novela e todos ficam no escuro, sem ter o que fazer; alguém vai procurar uma lanterna e outro acende uma vela para iluminar não se sabe o quê.
É o instante em que alguém abre um livro, liga o radinho de pilhas, resgata um volume de palavras cruzadas, telefona para a Eletropaulo e descobre que a luz só vai voltar lá pelas três da manhã. Os vizinhos decidem sair à rua, alguns de meias, e há quem se proponha a trazer umas cadeiras enquanto as crianças rolam no chão e comem terra.
A janta é esquentada no fogão, em banho-maria, e as novidades da rua são compartilhadas num telejornal participativo que termina com um adolescente botando fogo num bombril e girando – um espetáculo pirotécnico severamente punido pelos pais. Alguém barbudo aparece com um violão. Um tiozinho já meio bêbado começa a recitar poesia, sendo ardorosamente aplaudido quando se esquece dos versos originais e passa a inventar.
O banho é decretado opcional e a calçada já está cheia de brinquedos, cobertores, tabuleiros de xadrez, uma roda de pôquer à luz de velas, um par de patins e um pessoal que conta histórias de terror sobre um bairro sem luz que é sitiado por zumbis.
Já são onze e meia quando alguém decide ir ao banheiro e descobre que a luz voltou, sabe-se lá há quanto tempo – um segredo que decide guardar para si, pelo menos até terminar a pipoca.
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É chegada a hora de sabotar os disjuntores e desligar a tevê puxando pela tomada: depois de 153 crônicas e quase três anos de tendinite provocada pelo constante manuseio do controle remoto, esta coluna deixa de ser publicada hoje, antes que os leitores inadvertidamente cochilem ou mudem de canal.
A partir deste domingo irei transmitir diretamente da revista sãopaulo, onde revezarei com Fabrício Corsaletti na cobertura dos principais assuntos da cidade – ou nem tão principais assim. Na verdade, um tanto quanto aleatórios.
Foi um prazer dividir este espaço com vocês, continuem enviando mensagens alvissareiras, sugestões, protestos, ameaças e ofensas em geral. Deixo aqui um agradecimento especial para Águeda Horn, a competente ilustradora deste espaço, que não reclamou nem uma vez dos assuntos mais abstratos e me desenhou com o cabelo azul.
Fiquem agora com nossa próxima atração, “Flor do Caribe”. Boa noite.
Sentirei sua falta na Ilustrada… Mas acaba me parecendo uma espécie de promoção, então, PARABÉNS! Você merece mais e mais. O Fabrício também é ótimo – será uma dupla Pelé e Jairzinho.
Beijos!