Governo da Nova Zelândia investe em novo efeito “Senhor dos Anéis”
Folha de S.Paulo – Turismo
5 de dezembro de 2013
por Vanessa Barbara
Quando o diretor neozelandês Peter Jackson escolheu seu país natal para filmar a trilogia “O Senhor dos Anéis”, baseada no romance de fantasia de J. R. R. Tolkien, a decisão foi certeira: para ele, nenhum outro lugar no mundo reunia uma variedade tão grande de paisagens num território reduzido.
Inspirado numa mítica era pré-histórica com traços da Inglaterra rural, o universo da Terra Média (Middle-Earth) é composto de vales profundos, desfiladeiros, desertos pedregosos, colinas, vulcões, florestas, lagos, cordilheiras, picos nevados, cascatas, geleiras, rios e planícies.
Na Nova Zelândia, o diretor encontrou tudo isso numa nação jovem e ainda pouco modificada pelo homem, um território que evocava a Europa medieval, mas sem a evidência acumulada de séculos de habitação e industrialização. Ao mesmo tempo, a equipe aproveitou-se da proximidade com a civilização e de recursos de metrópoles como Auckland e Wellington, sede da companhia de efeitos especiais Weta Digital.
Segundo Jackson, na Nova Zelândia há pontos onde é possível posicionar a câmera e “enxergar 50 km à frente sem postes de luz, casas, estradas, só imensidão. Isso dá ao filme aquela qualidade épica de figuras pequenas numa paisagem imensa”. Lá, muitos cenários proporcionavam um ângulo limpo de 360 graus em qualquer direção.
A primeira trilogia foi filmada de outubro de 1999 a dezembro de 2000 em mais de 150 locações, incluindo a região vulcânica do monte Ruapehu, na ilha norte, que fez as vezes da Montanha da Perdição, onde Sauron forjou o Anel, e as suaves colinas de Matamata no papel de Condado, terra dos hobbits.
Onze anos depois, em março de 2011, teve início o processo de filmagem da nova trilogia, que durou 266 dias, durante os quais Jackson utilizou localidades como o lago Tekapo (de um azul-turquesa vivo) e o gélido monte Cook, o mais alto do país.
No próximo dia 13, estreia nos cinemas o segundo filme da nova série. Em “O Hobbit 2: A desolação de Smaug”, Bilbo Bolseiro retoma sua aventura com um grupo de anões em busca do tesouro roubado por um dragão.
Mais uma vez, a Nova Zelândia faz questão de explorar o potencial turístico dos filmes tolkenianos. Em 2001, antes mesmo do estrondoso sucesso de bilheteria e das estatuetas do Oscar que estavam por vir, o governo fundou um Ministério do Senhor dos Anéis, com a atribuição de auferir vantagens econômicas a partir da franquia. Na mesma época, um dos principais jornais de Wellington mudou temporariamente o nome para “Middle Earth Evening Post”.
Em 2004, 6% dos turistas citaram os filmes como um dos principais motivos da visita ao país.
Ano passado, pouco antes da estreia do primeiro capítulo da nova trilogia, o Departamento de Turismo lançou a campanha “100% Nova Zelândia, 100% Terra Média”. Já a companhia aérea Air New Zealand produziu um vídeo temático de procedimentos de emergência com magos e trolls apertando os cintos.
Hoje incontáveis empresas oferecem tours temáticos para fãs da obra, que vão de passeios tradicionais liderados por guias vestidos de orcs a experiências de aventura, passeios de caiaque, de bicicleta e de helicóptero.
Jornada pela Terra Média: Ilha norte
Um dos poucos cenários que restaram intactos das filmagens de “O Senhor dos Anéis” e “O Hobbit” pode ser visitado em Matamata, a 73 km de Rotorua, na ilha norte. É lá que se encontra Hobbiton (hobbitontours.com), fazenda que serviu de base para o Condado.
São 44 tocas coloridas encravadas nas montanhas, um moinho, um lago, uma ponte, uma enorme tenda de festa, um carvalho e a taverna Green Dragon, onde se pode descansar os pés peludos e tomar uma caneca de cerveja artesanal. Os passeios guiados saem a cada meia hora do restaurante Shire’s Rest, que a propósito oferece café da manhã o dia inteiro, na melhor tradição hobbit. O ponto alto do tour é a imponente Bag End, a casa de Bilbo.
Mais ao sul, em Hamilton, uma empresa com o sugestivo nome de Hairy Feet (Pés Peludos) oferece excursões guiadas pelo vale Mangaotaki, a floresta Trollshaw, onde Bilbo recebe a espada das mãos de Gandalf e os três trolls fazem uma fogueira para cozinhar os anões, entre outras cenas-chave de “O Hobbit”. Os tours ocorrem duas vezes ao dia, têm 1 hora e meia de duração e custam R$ 93 por pessoa (www.hairyfeetwaitomo.co.nz).
A Nova Zelândia oferece nove famosas trilhas para caminhada, chamadas de Great Walks (greatwalks.co.nz). Uma das mais evocativas para os fãs é a Tongariro Northern Circuit (49 km, três dias), com vulcões, poças de lava, lagos cor de esmeralda e vista para o monte Ngauruhoe – ou seja, a Montanha da Perdição. Para imitar Frodo e Sam nessa sugestiva caminhada rumo ao inferno, o turista deve comprar um passe de R$ 84 que dá direito a passar a noite em pontos de acampamento.
Já na capital, Wellington, uma atração obrigatória é a Weta Cave (wetanz.com/cave), que fica ao lado do estúdio de efeitos especiais Weta Workshop. Lá existe um museu de entrada gratuita que exibe bonecos, maquetes, máscaras e espadas utilizados na produção dos filmes. A cada meia hora há tours pagos que explicam melhor a parte técnica do processo e mostram setores do ateliê. Foi lá que se confeccionou a estátua de doze metros da criatura Gollum que se encontra no aeroporto de Wellington, e também das águias – uma delas com Gandalf – apresentadas ao público no início desta semana, em comemoração ao lançamento de “O Hobbit 2”.
Ainda no subúrbio da metrópole, as trilhas do monte Victoria aparecem no cinema como as cercanias do Condado, onde, no primeiro filme, os hobbits vão apanhar cogumelos e se esconder dos nazgûl, antes de conseguirem pegar a balsa para Bree. Em monte Victoria há também uma pedreira que foi usada como acampamento dos Rohirrim.
A meia hora de distância fica o Kaitoke Regional Park, em Upper Hutt, onde foram rodadas as cenas da terra élfica de Rivendell. Hoje é um bom lugar para fazer piqueniques, caminhar e nadar.
Mais quinze minutos de estrada e chega-se ao Harcourt Park, cenário para os jardins de Isengard e para o campo de árvores derrubadas pelos orcs. (O parque abriga também um ponto da Falha de Wellington, área crítica de atividades tectônicas que resultaram num desnível de 5 metros.) O rio Hutt foi usado em inúmeras ocasiões para retratar os rios Anduin e Rohan.
Jornada pela Terra Média: Ilha sul
A despeito dos atrativos geotermais e do ar idílico da ilha norte, as locações mais impressionantes se encontram na ilha sul, um território menos habitado e tomado por florestas alpinas, fiordes, lagos glaciais e cachoeiras de gelar o sangue. (Esta repórter chegou a chorar de frio durante um passeio de jet boat.)
Entre os cenários deste próximo filme está o rio Pelorus, onde os anões são arremessados dentro de barris na tentativa de fugir de um grupo de elfos. A Pelorus Eco Adventures oferece passeios de caiaque pela região onde a cena foi filmada, com águas esverdeadas e rochas brancas. (A aventura de três horas e meia custa R$ 180 por pessoa e deve ser agendada no site: kayak-newzealand.com.)
Saindo de Nelson, quem deseja alcançar o ponto onde a Sociedade do Anel se esconde dos corvos de Sauron e chora a perda de Gandalf deve contratar os serviços da Nelson Helicopters (nelsonhelicopters.co.nz) ou da Tasman Helicopters (tasmanhelicopters.co.nz), com motoristas que efetivamente ajudaram nas filmagens. Os tours aéreos custam R$ 660 por pessoa e sobrevoam estranhas formações rochosas de áreas como o monte Owen, monte Olympus, lago Boulder, Canaan Down e Harwood’s Hole.
Para visitar o local onde se construiu Edoras, capital de Rohan, os turistas podem contratar a empresa Hassle-Free Tours (hasslefree.co.nz), que sai do centro de Christchurch. O passeio de jipe pela região do monte Potts tem a duração de 8,5 horas e custa R$ 460 por pessoa, com direito a uma vista de 360 graus sob a mesma perspectiva da personagem Eowyn, além de panorâmicas das Montanhas da Névoa e do Abismo de Helm.
A partir de Queenstown, a capital da aventura, as ofertas de atividades surgem às dezenas.
Os fãs mais radicais podem fazer bungee jumping na ponte do rio Kawarau, que no filme fez as vezes de rio Anduin (bungy.co.nz/kawarau-bungy-centre). A altura da queda é de 43 metros, neste que é considerado o primeiro bungee do mundo – o salto inaugural foi há 25 anos, em novembro de 1988. Fazendo pouquíssimo caso de seu instinto evolucionário de autoconservação e perpetuação da espécie, esta repórter passou pela experiência e teve a incômoda sensação de que o cérebro estava se descolando do crânio a uma velocidade de 80 km/h. A despeito do aneurisma iminente, é possível apreciar a paisagem, sobretudo quando se sobrevive. O primeiro salto custa R$ 336, o segundo R$ 90.
Saindo (ileso) de lá, a sinuosa estrada que leva até a vinícola Chard Farm (chardfarm.co.nz) contém uma vista espetacular para o rio esverdeado, no ponto preciso onde foram erguidos digitalmente os pilares dos Argonautas. A Chard Farm oferece uma degustação de pinot noirs e outros vinhos produzidos no local, com interessantes explicações do simpático Dave Laurent.
Para aqueles que, por questões de sensatez ou evolucionismo, não aprovam o arremesso de si próprio em cima de uma ponte, mas gostariam de chegar mais perto do rio Kawarau, uma opção é fazer rafting. A empresa Extreme Green Rafting (extremegreenrafting.co.nz) organiza passeios que custam R$ 365 por pessoa, com equipamento incluso (trajes impermeáveis, botas, coletes, capacetes e remos).
A partir do centro de Queenstown, é possível fazer uma série de excursões temáticas de um dia inteiro ou metade do dia, como as promovidas pela Nomad Safaris (nomadsafaris.co.nz). Os passeios de jipe sobem através das Remarkables, cordilheira que serviu de inspiração para as Montanhas da Névoa, e oferecem uma vista panorâmica de Deer Park Heights, utilizada nas cenas dos refugiados de Rohan e na batalha contra os wargs. Depois passam por Arrowtown, onde Isildur perdeu o anel, e Skippers Canyon, onde Arwen cavalga com Frodo para longe dos vilões.
Também é possível ir pelo ar com empresas como a Glacier Southern Lakes Helicopters (glaciersouthernlakes.co.nz), cujo piloto Alfie Speight ajudou nas tomadas áreas dos filmes. Nesse caso, não deixe de sobrevoar o monte Earnslaw, onde, em “O Hobbit”, Bilbo continua sua jornada após sair de Rivendell. Vale a pena conhecer toda a área montanhosa e gélida de Te Anau, com destaque para os estreitos de Milford e Doubtful, além do lago Manapouri, que serviu de base para os territórios ao sul de Rivendell.
Outra boa forma de explorar essa região – de clima inóspito e difícil acesso – é fazer um passeio de caiaque pelo rio Dart (dartriver.co.nz/funyaks), saindo de Glenorchy. Pode-se remar como um elfo através de riachos escondidos, lagos cristalinos e piscinas rochosas do Parque Nacional de Monte Aspiring, ainda que a experiência seja às vezes cansativa. Durante a jornada dá para vislumbrar as imponentes montanhas que serviram como cenário para Isengard.
Na volta a Glenorchy, o guia vai mostrando uma região compreensivelmente chamada de Paradise (Paraíso), onde foram filmados o território de entrada de Lothlórien (terra de Galadriel) e Amon Hen, onde Merry e Pippin são capturados pelos orcs. Há também a opção de fazer um passeio a cavalo pela área, promovido pela Dart Stables (dartstables.com).
Saindo da cidade de Alexandra, no extremo sul da ilha, a dica para os que sobreviveram à jornada e ainda têm energia é alugar uma bicicleta e seguir a Otago Central Rail Trail (otagocentralrailtrail.co.nz). O ponto final é Poolburn Dam, um lago muito azul com vista para Rohan, que é também uma das locações preferidas de Peter Jackson.
Box:
Kiwis tentam afastar crise na indústria do cinema
Nem só de Tolkien vive a Nova Zelândia. Entre as últimas produções cinematográficas que elegeram o país como locação principal estão: “O Último Samurai” (2004), “As Crônicas de Nárnia: O Leão, a feiticeira e o guarda-roupa” (2005), “King Kong” (2005), “Príncipe Caspian” (2008) e “Avatar” (2009).
Porém, nos últimos meses, há fortes indícios de uma crise no setor, conforme superproduções vão migrando para outros países em busca de melhores incentivos do governo. Na Nova Zelândia, uma lei garante aos filmes estrangeiros de grande porte um retorno de 15% sobre o valor gasto no país. Países como Grã-Bretanha, Austrália, Canadá e África do Sul já oferecem 25%, e a Irlanda, 32%. Outro fator que tem afastado possíveis interessados é o valor do dólar neozelandês, que está em alta.
O cenário é crítico quando se considera que 80% dos empregos na indústria de cinema do país vêm de produções estrangeiras.
Há dois anos, Peter Jackson quase levou “O Hobbit” para o leste Europeu, mas acabou mudando de ideia após acordos trabalhistas e aumento de incentivos fiscais. Desde que a série de TV “Spartacus” foi cancelada e as filmagens terminaram, em outubro do ano passado, muitos atores kiwis (como são chamados os neozelandeses) se queixam de não haver mais oportunidades de trabalho.
Para piorar, a continuação de “Avatar” não foi confirmada, e há rumores de que será rodada na Austrália ou no México.
EXCURSÕES PARA A TERRA MÉDIA
Sem aéreo nem refeições, pacote por pessoa em quarto duplo (cotação do dia)
R$ 9.650
Quatorze noites pela Nova Zelândia com acesso exclusivo a propriedades particulares usadas nas filmagens, sendo uma noite em Auckland (The Spencer on Byron), uma em Rotorua (The Millennium Hotel), uma em Ohakune (The Powderhorn Chateau), três em Wellington (The Amora Hotel), uma em Nelson (Trailways Hotel), uma em Blenhein (The Quality Hotel), uma em Christchurch (The Sudima Hotel), uma em Twizel (Mackenzie Country Inn), uma em Cromwell (The Golden Gate Lodge) e três em Queenstown (Novotel Lakeside Hotel). É o mais abrangente da categoria. Há também uma opção de dez noites por R$ 8.120. Na Red Carpet Tours; redcarpet-tours.com.
R$ 10.290
Doze noites em um tour criado em parceria com Ian Brodie, autor dos guias “The Lord of the Rings Location Guidebook” (2002, HarperCollins) e “The Hobbit Location Guidebook” (2013, HarperCollins). Uma noite em Auckland (Rendezvous Hotel), uma em Hamilton (Novotel Tainui), uma em Ohakune (Powderhorn Chateau), três em Wellington (James Cook Hotel Grand Chancellor), uma em Nelson (Trailways Hotel), uma em Methven (Methven Resort), uma em Twizel (Mackenzie Country Hotel), uma em Cromwell (Golden Gate Lodge), duas em Queenstown (Copthorne Hotel and Resort Queenstown Lakefront). Saída em 10 de fevereiro de 2014. “Long Expected Journey to New Zealand”. Na Leisure Times Tours; leisuretimetours.co.nz.
R$ 8.970
Nove noites em hotéis quatro estrelas, num tour guiado por atores que interpretaram os anões da comitiva de “O Hobbit”: Nori, Dori ou Dwalin. Uma noite em Auckland, uma em Rotorua, uma em Waitomo, duas em Wellington, uma em Dunedin, duas em Queenstown, uma em Twizel e término em Christchurch. Inclui algumas refeições. “Hobbit Road Trip”, na Odyssey Traveller; odysseytraveller.com/tours/the-hobbit-road-trip-4/tourDetail.
R$ 5.650
Oito noites, sendo uma em Rotorua, duas em Christchurch, quatro em Queenstown e uma em Te Anau. “Land of the Rings Tour”. Na Thrifty Tours; thriftytours.co.nz/land-of-the-rings
R$ 5.390
Sete noites, sendo duas em Rotorua, duas em Wellington e três em Queenstown, com passeio a Milford Sound. O tour termina em Christchurch. “Middle-Earth Discovered”. Na Thrifty Tours; thriftytours.co.nz/middle-earth-discovered.