Folha de S.Paulo – revista sãopaulo
9 de fevereiro de 2013
por Vanessa Barbara
Uma das maneiras mais fáceis de identificar gente pobre em um shopping de luxo é analisar a conduta na escada rolante: se o sujeito encostar à direita, dando passagem para quem tem pressa, pode contar que é ralé.
Tal comportamento, praticado de forma automática por esta colunista, é indicativo do desagradável hábito de frequentar trens e metrôs (onde o procedimento é manter a esquerda livre para circulação), podendo ser tomado como um sinal de que o meliante estaria ali para participar de rolezinhos, causar tumulto e incomodar gente de bem.
Outra maneira segura de apontar desajuste social em locais chiques é postar um informante no banheiro. Quem vem da periferia pode ir direto para o reservado a fim de lavar o rosto, aliviar a bexiga, pentear o cabelo, fazer a toalete e encher a garrafa de água no bebedouro.
Gente diferenciada também costuma matutar como faz para abrir a torneira; hoje em dia, o ato de lavar as mãos exige muito insight para não passar vergonha, enquanto abanamos em desespero as mãos em busca de um sensor que ative o jato de água ou de sabonete líquido. Às vezes há dissimuladas alavancas, pedais ou botões.
Em suma, qualquer pessoa que demonstre incerteza diante da pia deve ser detida para averiguações.
(Até no âmbito mais privado pode haver armadilhas para o populacho; basta deixar registrado que, no banheiro de um hotel, em Londres, puxei uma cordinha vermelha achando que era a descarga. E disparei um alarme.)
Nas lojas, é altamente suspeito aquele que demonstra surpresa diante do preço de um produto, ou mesmo que não entende quando o vendedor diz que um vestido custa “sete quatro cinco”. (Em tempo: não é R$ 7,45, e sim R$ 745,00, mas você pode pagar em seis vezes no cartão.)
Aliás, quando o vendedor faz uma breve análise visual do cliente e começa a falar em crediário e promoção, pode apostar que alguém no balcão já apertou um botão vermelho para chamar a segurança. O fato de haver um homem de terno com walkie-talkie na mão atrás de você o tempo inteiro também não é bom sinal.
Outras atitudes suspeitas: perguntar se tem algo mais “em conta”, trazer a própria sacola de casa, rir do preço achando que é piada. Por experiência própria, não ajuda bradar: “É noventa? Pois eu pago quinze”.
Não é fino andar de mochila, usar boné de aba reta, fazer chacota das blusas na vitrine e apontar uma costura malfeita, dizendo que “isso aqui virou o Brás”.
Grande indicativo de pobreza é pedir para passar dez reais no crédito – sobretudo se, na hora de sacar o cartão, você tirar sem querer da bolsa o Bilhete Único.
Já estava na hora de alguém criar maneiras seguras de detectar o zé-povinho! Ouso acrescentar também que os seguranças deveriam verificar os calçados: no caso de serem chamados de “chinelas”, podem enquadrar.
Mas essa gentinha se articula, e podem perceber logo este artifício, usando as mesmas sandálias de grife e as chamando pelo nome. Não há problema: basta olhar embaixo delas e ver se há algum preguinho fazendo reparo às tiras. É batata (para ficar em hortaliças) que se trata de ralé.
Por último, todo cuidado com jornalistas mandaquienses. Convém barrá-los já na saída da catraca do metrô.
As estórias desta senhora são uma pândega!