O Estado de São Paulo – Caderno 2
1 de setembro de 2014
por Vanessa Barbara
Interrompemos nossa programação normal para transmitir o horário gratuito obrigatório de propaganda eleitoral. Dentro de uma semana, voltaremos a temas mais agradáveis.
*
Primeiro entra a vinheta colorida do partido, seguida de uma breve introdução ao candidato. Alguns cumprimentam o eleitorado com um “oi, lindinhos” ou apresentam a relevantíssima informação de que Fulana de Tal é “casada, três filhos”. Uma postulante a senadora é vista jantando com a família, e há depoimentos elogiosos dos pais, da sobrinha, das irmãs e da copeira.
Dois candidatos aparecem com cachorros no colo – os nomes dos animais são Bigodinho e Chupisca, e nenhum deles parece estar muito à vontade. Chupisca dá uma festiva lambida na cara da candidata, que diz estar “cansada de enxugar gelo e blá-blá-blá”.
Outra propaganda fala do Senado em primeira pessoa: “Tenho 190 anos de história, posso ser bem melhor nos próximos oito”.
Inúmeros pretendentes a deputado adotam a alcunha pela qual são conhecidos, como João Zelador, Cidão do Sindicato, Adalberto dos Colchões, Alex da Academia, Gê Guarda Noturno, Marquinho do Lixão e o Professor Fláudio, que deve ter sofrido muito bullying dos alunos. Há representantes dos dentistas e das domésticas. Um deles pede: “Aposentados, votem em aposentado”, que é um argumento contraditório para quem pretende deixar a aposentadoria. O outro diz: “Vote em gente que gosta de gente”.
Uma quantidade desproporcional de candidatos se apresenta como baluarte da renovação, incluindo Dilma e Kassab. Alguns não temem a contradição, prometendo “mudança com tradição” e “renovação com experiência”. Uma política declara que “desde 1989, o país caminha para o abismo”. Outro argumenta: “Recentemente perdemos a Copa e estamos quase perdendo a Petrobras”.
Numa produção tosca, um candidato e seu “raio privatizador” prometem exterminar comunistas, maconheiros e grevistas. Seu bordão é: “Magoe um socialista, vote no Batista”.
Em clara oposição a evangélicos como Clark Crente, do Paraná, o postulante a deputado Toninho do Diabo tem como bordão: “A coisa tá feia, a coisa tá preta, o negócio é votar no capeta”.
Temos um Barack Obama no Rio e um Bin Laden em São Paulo. Em Pernambuco, dá pra votar em Jesus.
Carrancudos, os candidatos a governador fazem críticas e acrescentam, abrindo o semblante: “Mas isso está prestes a mudar com o programa Você Mais Feliz [ou qualquer outro nome de efeito], que vai trazer mais contentamento ao cidadão [ou qualquer outra promessa vaga]. Por meio dos Centros Integrados de Entusiasmo Direcionado, nós levaremos…”.
Em todo caso, a campanha mais instigante começa com a seguinte pergunta, que deixo em aberto para a reflexão dos leitores: “O que você mais deseja para aquela sua amiga que acabou de ficar grávida ou para o seu avô que acabou de fazer 80 anos?”.
Minha resposta: felicidades ao casal.