O Estado de São Paulo – Caderno 2
17 de novembro de 2014
por Vanessa Barbara
Existem muitos estudos científicos relevantes na academia, como aquele que usou o magnetismo para levitar um sapo e um outro que estudou os índices de fricção entre sapatos e cascas de banana – ambos ganharam o IgNobel –, mas meu preferido foi conduzido pelo psicólogo social Paul Piff, da Universidade da Califórnia, em meados de 2012. Gerou uma das palestras mais populares do circuito TED: “Does money make you mean?” [O dinheiro te torna mau?].
Piff projetou uma partida manipulada de Banco Imobiliário em que certos jogadores, escolhidos aleatoriamente, começavam com uma série de vantagens: o dobro do dinheiro inicial, jogar dois dados em vez de um só e a certeza de ganhar duzentos dinheiros ao passar pelo ponto de partida (em vez de cem).
Por meio de câmeras ocultas, Piff notou que os jogadores “ricos” se tornavam cada vez mais agressivos e ostentatórios, e menos sensíveis à condição do oponente depauperado. Pior: após o término da partida, chegavam a atribuir a vitória a suas habilidades pessoais, mesmo sabendo que o jogo havia sido manipulado desde o início para que eles tivessem mais oportunidades de ganhar.
O objetivo do experimento era mostrar como a mente processa o conceito de vantagem numa sociedade hierárquica como a nossa – na qual poucos têm acesso à maioria dos recursos e por isso tendem a perpetuar seus privilégios.
Em cerca de trinta estudos conduzidos ao longo de sete anos, Piff e sua equipe mostraram que os mais pobres costumam ser mais generosos com desconhecidos e que os mais ricos são três ou quatro vezes mais propensos a trapacear. Motoristas de carros chiques estariam mais inclinados a infringir leis de trânsito e a desrespeitar pedestres, talvez numa tentativa de proteger seu patrimônio. Ricos mentiriam mais em negociações e aprovariam condutas de trabalho antiéticas. Piff chegou a comprovar que, na comparação, os mais abastados tendem a literalmente tirar mais doces de crianças, surrupiando guloseimas de uma jarra.
A principal conclusão da pesquisa é: conforme cresce a riqueza material de um indivíduo, seus sentimentos de compaixão e empatia diminuem, ao passo que aumenta seu egoísmo. Quanto mais rico, mais merecedor dessa riqueza você se sente. Piff fala em uma “ideologia de interesse próprio” e de pessoas que se colocam acima das demais, considerando ética a busca de sucesso pessoal mesmo em detrimento dos outros.
Em certos círculos, os achados de Piff foram considerados – desculpem! – pífios, sobretudo por atenderem a uma agenda esquerdista; no entanto, a arrogância com que alguns dos detratores se expressaram serviu para confirmar a premissa.
É algo que F. Scott Fitzgerald já havia notado em O Grande Gatsby, quando falou em vozes cheias de dinheiro e pessoas que esmagavam “coisas e criaturas e depois se protegiam atrás da riqueza ou de sua vasta falta de consideração”.