O Estado de São Paulo – Caderno 2
24 de novembro de 2014
por Vanessa Barbara
“Esse pouso do robô Philae num cometa a 500 milhões de quilômetros da Terra é a coisa mais incrível que a humanidade produziu desde o gol olímpico do Marcos Assunção contra o Atlético Mineiro em 2010”, declarou, no Facebook, o jornalista Matheus Pichonelli.
E eu diria mais: fazer a baliza e estacionar uma geringonça do tamanho de uma máquina de lavar num cometa de verdade me parece algo tão inacreditável quanto a existência da pasta de dente com listras refrescantes. Pertence ao reino dos ornitorrincos, do catupiri, das auroras boreais, do Louis Armstrong. E da Muralha da China.
De vez em quando acontecem essas coisas: a gente acha que já viu de tudo, que está velho demais para se surpreender com a vida desde que assistiu àquele vídeo do indiano subindo no teto de um ônibus com uma moto na cabeça, aí vem uma sonda e pousa num cometa. E você se sente uma criança de quatro anos diante de uma girafa. (O que diabos está havendo? Que tipo de feitiçaria é essa?)
A primeira reação ao receber uma notícia desse porte é declarar peremptoriamente: “É montagem”. Ainda que existam fotos do pouso do Philae, não há dúvidas de que se trata de uma espetacular lorota, tal qual a primeira caminhada de Neil Armstrong e a enurese de Buzz Aldrin na Lua. (Dizem que ele foi o primeiro homem a fazer xixi na superfície lunar, dentro do traje espacial e diante de uma plateia de 600 milhões de espectadores.) Conheci um sujeito que, apresentado a fatos assombrosos de natureza diversa, não hesitava em proclamar: “Isso aí é grupo”. Tudo fazia parte de uma conspiração para desmoralizá-lo. E é bom não acreditar em nada porque vão é rir da sua cara.
Sondas não pousam em cometas, assim como eletricidade é bruxaria e não existe mofo milagroso que cura infecções. Eu, se vivesse na Idade das Trevas, passaria os dias excomungando os ímpios e fazendo troça de quem garante que a Terra gira em torno do Sol – e por falar nisso, ninguém ainda conseguiu me convencer de que as estrelas não estão realmente grudadas no firmamento como numa pintura. Se o nosso sol é mais brilhante que Antares, é porque evidentemente é maior, e ponto.
A verdade é que até hoje fico muitíssimo espantada com espetáculos de mágica, sendo absolutamente incapaz de entender como são feitos, mesmo quando se tratam de truques com baralhos falsos ou moedas com duas caras – eu me levanto e aplaudo com gosto, olhando feio para as criancinhas entediadas.
Mesmo sabendo que a sonda quicou antes de pousar, depois ficou sem bateria e talvez não volte mais a funcionar, as notícias da Philae podem ser resumidas num adjetivo que as nossas mães usavam quando tomávamos um susto: “Não foi nada, você só está impressionada”.
Pois bem, Agência Espacial Europeia: estou impressionada. Você é tão lendária quanto o gol do Marcos Assunção – e olha que eu nem sou palmeirense.