O Estado de S. Paulo – Caderno 2
13 de abril de 2015
por Vanessa Barbara
Depois da crônica “Extraordinários” (O Estado de S. Paulo, 5/1/2015), vários mineiros de confiança vieram me procurar para dizer que: a) estavam presentes quando o tiranossauro perseguiu o Chevette na estrada de Piau para Coronel Pacheco; ou b) gostariam de mais informações sobre a criação de tarântulas; ou c) a planta que germinou dentro do gesso do indivíduo citado era um pé de feijão.
Outras histórias vagamente críveis foram relatadas, motivo pelo qual resolvi publicar uma segunda parte da série sobre os mineiros, esses seres que estão sempre nos lugares mais improváveis em momentos pouco cabíveis, junto a criaturas que podem ou não existir no universo cognoscível.
Um amigo me contou de um senhor de Governador Valadares que tentou imigrar para os Estados Unidos sem falar inglês. Dentro de uma van cheia de ilegais, ao ouvir o policial da fronteira dizer ao motorista: “OK, thank you very much”, ele entendeu: “OK, tranque o velho e mate”. E saiu gritando: “Não, por favor, não precisa matar, não”.
Fica a critério do leitor, dependendo de seu estado de origem, acreditar ou não nessa anedota.
Da mesma fonte veio o caso de uma senhorinha, também mineira e imigrante, que trabalhava num restaurante americano. Segundo consta, ela ficava indignada quando ouvia o chefe gritar: “Potato! Potato!”, porque entendia: “Puteiro! Puteiro!”.
Tem também a história de um camarada que, na infância, meteu um grão de feijão numa das narinas enquanto brincava com uma porção crua da referida fava. Como o item não bloqueou sua respiração, lá ficou; dizem que só descobriram a traquinagem quando um galho verde começou a brotar do interior de seu nariz.
Da respeitável e extensa tribo dos metaleiros de Juiz de Fora veio a história do sujeito que capturou um morcego na mangueira do quintal e o levou para o festival de bandas novas. O morcego se tornou um sucesso, pulando e se debatendo loucamente dentro do bolso da camisa do rapaz. Todos interpretaram convenientemente que ele estava curtindo o som.
Todo mineiro é biologicamente capaz de recontar uma história extraordinária com o rosto impassível, sem esboçar dúvida; caso o interlocutor cometa a imprudência de duvidar do fato, ele desfia na hora um rosário de parentes distantes que podem confirmar a veracidade da informação, indivíduos com os quais você nunca terá contato.
Meu colega Humberto Werneck, jornalista de integridade inatacável, que escreve neste jornal aos domingos, mencionou um conterrâneo que jurou nunca mais botar os pés na calçada em frente à própria casa depois que a Prefeitura passou a cobrar taxa de pavimentação. “Para sair, ele estendia uma tábua do portão à rua; na volta, dava um berro e alguém da casa vinha com a tábua, qual ponte levadiça”, contou. “Dizem que por ali passou seu corpo rumo ao cemitério.”