Assa Ariyoshi

Assa Ariyoshi

The International New York Times
26 de junho de 2015 

Por Vanessa Barbara
Contributing Op-Ed Writer

SÃO PAULO, Brasil – No mês passado, os professores da rede pública estadual de São Paulo anunciaram o fim de uma greve de três meses – sem que nenhuma de suas demandas tenha sido atendida. Pela primeira vez, a greve chegou às manchetes de um jornal de grande circulação; até então, havia sido praticamente ignorada. A manchete dizia: “Derrotados, professores de SP põem fim à greve”.

Foi a greve de professores mais longa do estado. Eles mantiveram até o fim a demanda de paridade salarial com outras categorias de profissionais com ensino superior – o que significaria um aumento de 75%. Trata-se de um incremento considerável, mas o princípio de paridade é previsto pelo Plano Nacional de Educação, uma lei sancionada no ano passado pela presidente Dilma Rousseff. De acordo com a lei, a paridade deve ser atingida até 2020.

Os professores também pediam classes menores com, no máximo, 25 alunos. A Secretaria de Educação estipula um número máximo de 40 alunos nas salas de aula do Ensino Médio, mas em fevereiro, no início do ano letivo, houve relatos de classes com 85 ou 95 alunos. Como se não bastasse, o governo fechou mais de 3 mil salas de aula este ano, de acordo com o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).

Para uma jornada de 40 horas, os professores com graduação que lecionam para alunos de 5a. série até o 3o. ano do Ensino Médio ganham um salário-base de R$ 2.415,89 por mês. E esse é o melhor dos casos; os que lecionam para as séries iniciais do Ensino Fundamental ganham R$ 2.086,93 por mês. A hora-aula dos professores das séries mais avançadas é de R$ 12,08, menos da metade do que recebe um trabalhador de fast-food nos Estados Unidos. Vamos repetir: eles ganham 12 reais para ensinar uma classe inteira de 40 alunos durante uma hora.

Os professores também se queixam de que o governo não respeita uma lei que dispõe que um terço da jornada de trabalho deve ser gasta em atividades extraclasse, como corrigir provas e preparar aulas.

Por piores que sejam, essas condições de trabalho só se aplicam aos professores oficialmente contratados pelo governo; dos 251 mil professores do estado, cerca de 57 mil (ou 23%) são temporários, sem garantias trabalhistas, aposentadoria ou seguro-saúde. Após o primeiro ano de contrato, um professor temporário deve ficar fora do trabalho por 40 dias; depois do segundo ano, o afastamento obrigatório aumenta para 200 dias por ano – mais de seis meses de desemprego para cada ano trabalhado. Essa tática tem sido utilizada desde 2009 para evitar que os professores temporários sejam considerados funcionários públicos com vínculos trabalhistas.

Os professores também pediam que o governo diminuísse a restrição nas perícias médicas. Eles reportam problemas de saúde frequente, resultantes do péssimo ambiente de trabalho. Em 2013, 7,3% (ou 14.340) dos 194 mil professores efetivos estavam afastados por motivos de saúde. Os números oficiais não estão disponíveis, mas, de acordo com um estudo feito pelo sindicato, o principal motivo das licenças médicas é a depressão, seguido de transtornos de ansiedade, rouquidão e hipertensão.

Mais de 4 milhões de alunos frequentam as 5,3 mil escolas públicas da rede estadual de São Paulo. Eles são, em sua maioria, pobres, já que as famílias mais ricas costumam matricular seus filhos em escolas particulares, onde os professores podem chegar a ganhar R$ 50 por hora.

Diante das demandas de centenas de milhares de professores, o governador Geraldo Alckmin reagiu com desdém. “Todo ano é essa novela”, ele declarou em março. Mais tarde, chegou a negar a existência da greve. (Também negou a crise hídrica, embora muitos bairros, como o meu, passem boa parte do dia sem água.)

Quanto às demandas dos grevistas, Alckmin disse que o governo já deu um aumento cumulativo de 45% nos últimos quatro anos. O sindicato afirma que esse número representa, em sua maioria, gratificações incorporadas ao salário, e que o aumento nos últimos quatro anos foi de 29,9%, no melhor dos casos. A inflação do período foi de 27,7%.

Alckmin também foi amplamente citado ao afirmar que o salário dos professores em São Paulo é 26% maior do que o salário mínimo da categoria (R$ 1.917,78), o que é verdade, embora poucos mencionem o fato de que o PIB per capita do estado é 48% maior do que o PIB do Brasil como um todo. Alckmin insistiu em dizer que a greve não tinha o menor sentido e que ele aumentaria os salários dos professores “na hora certa”.

Alguns grevistas lembraram que, em janeiro, o governador aumentou o próprio salário em 4,7% – ele ganha atualmente R$ 21.631 – e os salários de seus 25 secretários em 17,8% – eles ganham R$ 19.648. O aumento mais recente havia ocorrido em 2013.

Após treze semanas de greve e dezenas de manifestações, o governador não fez uma única proposta de aumento para os professores. Apenas propôs estender o plano de saúde aos professores temporários (mediante um desconto de 2% do salário) e diminuir o afastamento obrigatório de 200 dias. No fim de maio, depois de brigar na Justiça, Alckmin conseguiu cortar o salário dos grevistas, o que levou ao fim da greve. Dias depois, um editorial de um jornal de grande circulação anunciou que os professores haviam sido desmoralizados em todas as frentes.

Como se a derrota já não fosse grande o suficiente.

Dois dias após vencer os professores, Alckmin foi anunciado pelo partido como um provável candidato à Presidência do Brasil, em 2018.


Vanessa Barbara é cronista do jornal O Estado de São Paulo, editora do site literário A Hortaliça e colunista de opinião do NYT. 

Este texto foi publicado em inglês no The International New York Times do dia 26 de junho de 2015. Tradução da autora.