O Estado de São Paulo – Caderno 2
5 de setembro de 2016
por Vanessa Barbara
Na semana passada, falei dos fotógrafos Alex Silveira e Sérgio Silva, que perderam a visão após serem atingidos por balas de borracha disparadas pela Polícia Militar em manifestações. Segundo decisões judiciais, ambos foram considerados culpados pela violência sofrida.
Na quarta-feira passada, tivemos mais uma ocorrência: a estudante Deborah Fabri, de 19 anos, foi atingida durante um protesto contra o governo Temer – não se sabe ainda se por bala de borracha ou por estilhaço de bomba. O Hospital de Olhos Paulista confirmou a perfuração do olho esquerdo. Ainda que Deborah ainda tenha uma mínima percepção luminosa, os prognósticos não são animadores.
Portanto agora temos em São Paulo, na conta do Estado, quatro pessoas que perderam a visão: duas atingidas por bala de borracha e duas por estilhaços de bomba. (O quarto da lista é Vitor Araújo, que ficou cego do olho direito e teve que passar por cirurgia de reconstrução facial após ser ferido por estilhaço de bomba de efeito moral durante uma manifestação em setembro de 2013. Ele também tinha 19 anos na época.)
Coincidência ou não, dois dos atingidos tinham 19 anos, dois eram fotógrafos. Dois também foram os fotógrafos detidos na manifestação da última quarta-feira, William Oliveira e Vinícius Gomes. Ambos foram agredidos por policiais e depois encaminhados ao pronto-socorro; um deles levou cinco pontos na cabeça, e outro teve sua câmera completamente destruída. Eles foram acusados de atirar pedras contra a tropa e ficaram ilegalmente detidos até as 5 da manhã, quando foi feito um registro de ocorrência em que eles constam como vítimas e testemunhas. Segundo os fotógrafos, nenhum dos agentes agressores trazia identificação na farda. Um amigo jornalista estava presente na cena e alega que a agressão ocorreu porque os fotógrafos estavam registrando um tombo dos policiais. Os cartões de memória das câmeras foram apagados.
Segundo a Folha de S. Paulo, foram sete os feridos na quarta-feira passada, entre eles quatro fotógrafos. Na quinta-feira, mais um desses profissionais entrou para a estatística ao ser atingido por uma bala de borracha na boca. Ele perdeu dois dentes.
Durante as manifestações, é normal ver policiais ordenando que os jornalistas parem de filmar. Dizem que não deram autorização e que tais gravações lesionam seu direito de imagem, ainda que qualquer cidadão tenha o direito de registrar a ação de agentes públicos no exercício de sua função. De acordo com o artigo 220 da Constituição, o direito à manifestação do pensamento, criação, expressão e informação não deve sofrer restrições, ainda que posteriormente possam ser invocados outros incisos do artigo 5o (como direito de resposta e indenização por danos morais).
Não é o que tem acontecido nas ruas de São Paulo. Aqui atualmente é proibido enxergar.