O Estado de São Paulo – Caderno 2
9 de janeiro de 2017
por Vanessa Barbara
O ano de 2016 começou com a Frida, uma vira-lata preta e frenética que resgatei de ser atropelada e que levei para casa junto com as compras do mês. Muito já foi dito sobre Frida e nunca será o suficiente – basta dizer que, no momento, ela se encontra feliz e confortável em seu novo lar com os cães Astor e Mocha, dormitando em cima desta coluna de jornal e perpetrando pequenas contravenções domésticas.
Sem negar suas origens, Frida já foi flagrada furtando um pote de ração de cima da mesa e levando para o sofá, onde ficou beliscando o quitute como se fosse pipoca. (Cogita-se que também roubou a senha da Netflix e assistiu à segunda temporada de “O Encantador de Cães”.) Frida já furtou um pote de Whey e convenceu a pequena Mocha a consumi-lo, para prejuízo do estômago desta.
Depois veio o Pokémon, um vira-lata caramelo que estava dormindo ao relento no inverno e parecia uma hiena famélica quando chegou. Assim como Frida, Pokémon foi castrado e recuperado para ser oferecido para adoção. Ele chegou a passar um tempo em um novo lar, mas a gata da casa ficou muito enciumada. O adorável vira-lata, que tem as orelhas mais expressivas da Zona Norte e adora passear, continua num lar temporário esperando um adotante responsável.
Já na primavera veio o Puppy, um poodle branco velhinho e surpreendentemente teimoso que foi abandonado pela tutora em Osasco e chegou esquelético e depressivo. Puppy tinha catorze anos de idade e o que mais fazia era ficar de pé e olhar para o chão, desolado. Ele gostava de quibe, mas não comia quase nada e vomitava muito.
A despeito da sua fraqueza, Puppy era um lorde e nunca fazia xixi na própria cama: ele se levantava, ia cambaleando até o meio da cozinha e se aliviava ali mesmo. Uma vez tentamos fechar o caminho para a sala com uma grade improvisada e ele saiu dando cabeçadas no obstáculo até ficar livre. Quando não gostava da comida, também dava vigorosas cabeçadas na tigela. Puppy estava morrendo, mas era o nosso cabeçudo preferido.
Ele passou alguns dias conosco antes de ser internado, e ficou na clínica por um mês, até descobrirem que estava com tumores generalizados. Morreu numa sexta-feira às seis da manhã e eu chorei no ônibus o caminho inteiro de volta. Ainda não consigo olhar para o hipopótamo vermelho de borracha que ficava do lado da cama dele. Até hoje estou pagando a conta do hospital. (Se alguém quiser ajudar, contatem a ONG Bendita Adoção, de Osasco, que aliás sempre precisa de padrinhos para os animais abandonados.)
Outro cão ilustre de 2016 foi o Paçoca, um vira-lata garboso de olhos claros e pelo branco e bege que foi resgatado pela minha cunhada e ganhou abrigo numa fazenda em Juiz de Fora. Ele veio tão traumatizado que tinha pavor até de receber carinho, mas hoje vive como um rei com sua amiga canina Zuzu (mandona) e a recém-chegada Lola, uma filhotinha marrom de cerca de quatro meses de idade que apareceu um dia no quintal, cheia de pulgas. Lola gosta de roer objetos e quando vê pessoas fica tão feliz que faz xixi no chão.
Foi um ano rico em amizades caninas, o que significa que foi um ano rico em geral. Também passeei com vários vira-latas da ONG Canto da Terra, com sede em Santana: o adorável Tibe, um cão preto e enorme que adora brincar com pinhas e foi adotado por uma família que mora num sítio; a Gil, uma cachorra preta e cheia de energia que também já foi adotada; o Velho, um idosinho extremamente dócil que faz questão de marcar com xixi todos os arbustos do caminho, mesmo que só saia um pinguinho; e o Flipo, um baixinho bege e feliz que gosta de correr. Estão todos disponíveis para adoção responsável.
O novo parâmetro para o sucesso de um ano é relembrar todos os cães que você ajudou.