O que o Rio pode aprender com Londres 2012 (antes que seja tarde)
Folha de S.Paulo – Esportes
Especial Olimpíada
12 de agosto de 2012
por Vanessa Barbara
O primeiro passo foi escolher a área mais pobre e degradada da capital, Stratford, e elegê-la como futura localização do Parque Olímpico. A região era uma antiga zona industrial, com áreas abandonadas e terrenos contaminados por petróleo, alcatrão, cianeto e metais pesados.
Cinco máquinas foram designadas para lavar, peneirar e sacudir o solo, que também recebeu um tratamento chamado biorremediação, no qual microorganismos naturais consomem petróleo e diesel. Quase 2 milhões de toneladas de terra foram limpas e recolocadas no próprio parque. A operação demandou quatro anos de trabalho.
Com 2,5 quilômetros quadrados (quase o dobro do Parque do Ibirapuera), o complexo ganhou uma cobertura de 4 mil árvores e 300 mil plantas aquáticas. O rio Lea, antigo esgoto a céu aberto, foi recuperado. Milhares de girinos, peixes e criaturinhas silvestres, retirados na fase de construção, foram devolvidos ao seu habitat.
As fábricas sediadas no local foram transferidas e ganharam a prioridade de serviço nos Jogos – a cobertura de PVC da Arena de Basquete foi produzida por uma empresa de Stratford. Também a mão de obra local foi privilegiada.
A proposta desta Olimpíada sempre esteve ligada à sustentabilidade. Minha parte preferida é a da mobilidade – 100% dos espectadores chegaram às instalações olímpicas via transporte público, bicicleta ou a pé. Não havia estacionamentos nos ginásios e nem em suas proximidades. Só autoridades, atletas e jornalistas, além de pessoas com mobilidade reduzida, puderam utilizar automóveis. (Ainda assim, muitos não o fizeram, como o time americano de basquete, visto esta semana esperando o trem, e o esgrimista venezuelano que pegou o metrô com a medalha de ouro no peito.)
Impressionado, o presidente do Comitê Olímpico Internacional elogiou o “legado tangível” destes Jogos, sem elefantes brancos para a população. A ideia foi utilizar edificações já existentes (as quadras de Wimbledon para o tênis, Earls Court para o vôlei) ou edificar estruturas temporárias.
As arenas de basquete e polo aquático, por exemplo, são recicláveis – ao final dos jogos, todas as estruturas (bancos, quadras, ferragem e até os parafusos) serão desmontadas e reutilizadas.
O funcional Estádio Olímpico, com uma capacidade original de 80 mil assentos, foi pensado de forma modular. Após os Jogos, será reduzido para 50 mil lugares, visando o Mundial de Atletismo, em 2017. Depois disso, ficará com apenas 25 mil.
Também os anexos do Centro Aquático serão removidos, mas as piscinas e a arquibancada permanecerão como legado.
A partir do ano que vem, o parque será aberto à população.
[…] Mas Londres deu ao mundo uma olimpíada primorosa. A toda hora parecia que alguma coisa ia dar errado – e tudo beirou a perfeição. A rede de transportes foi impecável, a segurança foi constante e até o clima ajudou. O planejamento foi tão minucioso que deixa uma cidade sem elefantes brancos – grandes áreas foram revitalizadas e a Vila Olímpica foi propositalmente construída numa das regiões outrora mais pobres de Londres, Stratford (a meros quatro quilômetros aqui de casa); primeiro erro brasileiro, que está construindo sua Vila Olímpica na abastada região da Barra da Tijuca. O legado sustentável que as Olimpíadas deixam a Londres é inegável. […]