Era uma mulher, uma pá,
uma vassoura de cabo curto e uma extensa rua de paralelepípedos.
Corria uma daquelas noites em que as pessoas se apressam para vestir
os pés com meias e os gorros com cabeças, a evitar que
o calor se perca por uma das extremidades (pensando nisso, Wilma usava
uma capa de bule no nariz, e uma faixa cinza em ambas as orelhas).
Bom, mas havia uma mulher de saias e chinelo de pelúcia, que
varria tranqüilamente a rua e falava sozinha, às onze
da noite. Acariciava com a piaçava cada mísero paralelepípedo.
:: MORTE DO LEITEIRO :: Na mão a garrafa branca E como a porta dos fundos Meu leiteiro tão sutil Mas este acordou em pânico Mas o homem perdeu o sono
Jamais te voltes para trás
de repente. O remédio é cantares
cantigas loucas e sem fim. Dessas que a gente inventava para enganar a solidão dos caminhos sem lua.
No início Deus criou a banca de jornal. E Deus viu que era bom. Então Deus reparou que ficava um povo ali em volta, jogando conversa fora, e pôs um isopor com côco gelado, e viu Deus que era bom. E disse Deus: do jornal lereis, do côco comereis e da água que dá no côco bebereis. E todos viram que era bom. Então Deus permutou com a Kaiser um pequeno freezer vertical e passou a vender as mais diversas bebidas: refrigerantes, cervejas, Gatorades. E vendo Deus que era bom também, arranjou umas mesas e cadeiras de plástico e fez da banca um pequeno bar. E viu Deus, pra variar, que era bom. Isso tudo em apenas seis dias. No sétimo, não sabe se descanse ou abre uma churrascaria rodízio.
Quem entra num poema não morre nunca.
A primeira namorada, tão alta Luzia na janela do sobradão.
Uns crêem em Deus, outros lêem Marx, e há até aqueles que vêem na tonificação dos músculos abdominais o sentido da vida.
Porque você é uma menina com uma flor e tem uma voz que não sai, eu lhe prometo amor eterno, salvo se você bater pino, que aliás você não vai nunca porque que você acorda tarde e gosta de brigadeiro: quero dizer o doce feito com leite condensado. E porque você é uma menina com uma flor e chorou na estação de Roma porque nossas malas seguiram sozinhas para Paris no meio de todas aquelas malas estrangeiras. E porque quando você sonha que eu estou passando você p/ trás, transfere a sua ddc para o meu cotidiano e implica comigo o dia inteiro como se eu tivesse culpa de ser assim tão subliminar. E porque quando você começou a gostar de mim procurava saber por todos os modos com que camisa esporte eu ia sair para fazer mimetismo de amor, se vestindo parecido. E porque você tem um rosto que está sempre num nicho, mesmo quando põe o cabelo p/ cima, como uma santa moderna e anda lento e fala em 33 rotações mas sem ficar chata. E porque você é uma menina com uma flor eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velho: mas só quando eu der aquela paradinha marota para olhar para trás, aí você pode se mandar, eu compreendo. E porque você é uma menina com uma flor e tem um andar de pagem medieval; e porque você quando canta nem um mosquito ouve a sua voz; e você desafina lindo e logo conserta, e às vezes acorda no meio da noite e fica cantando feito uma maluca. E porque você tem um ursinho chamado Nounouse e fala mal de mim pra ele, e ele escuta mas não concorda porque é muito meu chapa, e quando você se sente sozinha e perdida no mundo você se deita agarrada com ele e chora feito uma boba fazendo um bico deste tamanho. E porque você é uma menina que não pisca nunca e seu lhos foram feitos na primeira noite da Criação, e você é capaz de ficar me olhando horas. E pôr que você é uma menina que tem medo de ver a Cara-na-vidraça, e quando eu olho você muito tempo você vai ficando nervosa até eu dizer que eu estou brincando. E porque você é uma menina com uma flor e adora purê de batata, eu lhe peço que me sagre seu Constante e Fiel Cavalheiro. E sendo você uma menina com uma flor, eu lhe peço também que nunca me deixe sozinho, como nesse último mês em Paris; fica tudo uma rua silenciosa e escura que não vai dar em lugar nenhum; os móveis ficam parados me olhando com pena; é um vazio tão grande que as outras mulheres nem ousam me amar porque dariam tudo para ter um poeta penando assim pôr ela, a mão no queixo, a perna cruzada triste, e aquele olhar que não vê. E porque você é a única menina com uma flor que eu conheço, eu escrevi uma canção tão bonita p/ você, "Minha namorada", a fim de que, quando eu morrer, se por acaso você não morrer também, fique deitadinha abraçada com Nounouse, cantando aquele pedaço em que digo que você "tem de ser a estrela derradeira, minha amiga e companheira, no infinito de nós dois." E já que você é uma menina com uma flor e eu estou vendo você subir agora - tão purinha entre as marias-sem-vergonhas - a ladeira que traz ao nosso chalé, aqui nessas montanhas recortadas pela mão presciente de Guinard; e o meu coração põe-se a bater cada vez mais depressa. E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta se faz murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos - eu sei, ah eu sei que o meu amor por você é feito de todos os amores que já tive, e você é filha dileta de todas as mulheres que eu amei; e que todas as mulheres que eu amei, como tristes estátuas ao longo da aléia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão, de mão em mão até mim, cuspindo no seu rosto e enfeitando a sua fronte de grinalda; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações - porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor.
Eu sou a garganta de João
A propósito, você sabe alguma coisa sobre educação artística na Espanha? Se souber, ligue pra mim - mas não diga alô. Diga "Por tutatis! O que são aquelas minhocas azuis descendo pelo encanamento?", e imite barulhos de estômago digerindo desinfetante (colorido), só então nós atenderemos. É estranho. Não estou conseguindo concluir meus pensamentos. A vida parece um email dentro de um email dentro de um filme oriental. Mudo. Escuta, você sabe fazer lasanha de queijo? Você devia ser uma espécie de informações gerais. Tipo uma avó, ou um curandeiro. Eu mandava uma pergunta, e plim, vinham várias respostas. Esqueci o que eu ia dizer realmente, era algo com relação à destruição da China por uma grande massa de maionese, acho que tive uma idéia sobre o ataque mas ela me escapuliu. Mas idéias virão, assim
como a dor de barriga. ps: "Pare de fumar fumando". Método revolucionário. Dos mesmos criadores de "Emagreça comendo" e "Mamãe vamos varrer a sala antes que cheguem as visitas". Ao se inscrever no nosso Projeto Anti-Tabagismo, você ainda ganha: 2 cachimbos, 1 flanela auto-limpante, 3 palmilhas de água, 1 pote de alcaparras ao molho madeira, 1 caspa e um exclusivo cinzeiro com a inscrição: "Papai não fume porque nós te amamos". Ligue já.
Embora nos filmes, enquanto você mede os prós e os contras, teu primo Tobias (que não tinha morrido quando você o jogou do penhasco, como pensava o espectador) sempre se aproxima, toma a tesoura nas mãos e facilita o trabalho.
Este Zine é impessoal. Computadores meticulosamente programados desenvolvem os textos, se emocionam, revisam e publicam a visão neutra e imparcial da coisa toda. O único responsável é a instituição "Da Redação".
Você está recebendo o !!DAMN!! Zine porque (oinc!) estava na lista de indivíduos manquitolas da lista negra dos Illuminati. Ou então, ou então! Você está recebendo o !!DAMN!! Zine porque foi um dos 139 mil nomes escolhidos entre todos os possíveis do mundo, sorteados em uma grande urna chinesa. Você e Li-Ching-Yang. Caso não queira voltar a receber este monte de bobagens, mande um e-mail para vmbarbara@brfree.com.br, e escreva na linha de assunto: "Me deixem em paz, pelas barbas de Tutatis!". Se quiser que mais vítimas recebam o Zine, também escreva para esse e-mail mandando o endereço dos condenados e o número e senha de suas contas bancárias. Se quiser usar cartão de crédito, basta fornecer o número. !!DAMN!! Zine - o zine das coisas que foram, das coisas que são o que são, das que não são o que não são e das que poderiam vir a ser o que não foram. Perfeito para forrar o chão de barracas fajutas e para embrulhar mortadela. Parceiro do tablóide norte-americano "O Sol da Meia Noite", mas não olhe pra trás porque tem um fauno fritando ervilhas nas suas omoplatas. "Em verdade, em verdade vos digo: Aquele que ri cuidado para que não babe".
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2005
Vanessa Barbara |