Cena 1 - Uma grande piscina, tarde de sol, clube de campo em Acapulco. A mulher falava às amigas que o namorado dela ria como um macaco, com a boca aberta ao máximo, sem fazer barulho. Aí um dia ele mergulhou, e quando subiu estava rindo desse jeito. Todo mundo riu. Ele afundou de novo, subiu, e riu. Todo mundo riu. Aí ele afundou e não voltou mais. Ele não estava rindo, ele estava engasgando. Moral: se você ri com a mesma cara que você engasga, mude seus hábitos. Cena 2 - Não se esqueça de colocar o arroz na geladeira, querido. Regue as plantas a cada dois dias. Beba água. Leia bons livros. Faça exercícios regularmente. Ame e será amado. Não saia sem blusa. Amarre sempre os cordões dos sapatos. Nunca aceite balas de estranhos. Feche o zíper. Seja agradável com as visitas. Não esqueça o guarda-chuva. Não pise na grama. Desembarque pelo lado esquerdo do trem. Use aromaterapia. Atravesse na faixa. Thank you for not hitting me. Previna-se contra o câncer de mama. Toque de novo, Sam. Vote Maluf. Seja o senhor mesmo a personalizar seu apartamento. Use camisinha. Não fume. Não ultrapasse a faixa amarela. Faça parte. Faça sua parte. Dê a melhor parte de você. Doe sangue. Use piercing. Não corra. Pare o cão. Crie corvos. Utilize dinheiro trocado. Continue na linha após a identificação. Compre avestruzes. Não grite. Disque 2 para falar com nossos atendentes. Seja polido. Nunca use o garfo de peixes. Não fure os olhos de sua irmã. Cuidado com o arame. Pare de esfaquear o vizinho. Um passo de cada vez. Sorria para o espelho. Faça caretas. Arranje encrenca com os parentes. Bombardeie o Pentágono. Seja feliz. Não encoste no suflê de carne. Morra. Tenha rancor no coração. Roube minhocas. Dance de chinelos. Faça barulho depois das dez. Vá para o inferno. Dane-se. Emplastifique-se. Cena 3 - Aproveitem o nosso #27, a promoção é só até sábado. Descontos progressivos para grupos. Obrigada.
Proibido pular o muro
:: PRODUTOS ::
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PARA DIZER ÀS PESSOAS GRANDES ::
Observo uma pequena gaivota bicando perfunctoriamente à sua volta e a considero pouco convincente. Eu sei que eles se esforçam, mas os animais são atores atrozes. Sempre estragam tudo. A Natureza não tem o dom do improviso: está sempre tediosamente se repetindo. Enquanto eu nunca faço a mesma coisa duas vezes, e é isso que me torna tão fascinante. Toda a minha vida tem sido uma longa prática antinatural. Não sou previsível como uma couve-flor.
:: ASSIM APRENDI A NÃO
ME PREOCUPAR E A GOSTAR DO CÃO :: Murphy saiu dali. Não queria mais problemas, e muito menos um olho adicional (já tinha tantos). Rumou, tropeçando na cauda, para o apartamento dos pais, mas não conseguiu passar pela porta porque a bolha do pescoço tinha o tamanho de um garoto de oito anos. Gordinho. A mãe, certamente, saberia o que fazer – mas ela apenas lhe ofereceu biscoitos e disse para que não se preocupasse, você sabe, eu já tenho problemas em excesso. A Igreja, a academia, a reunião de tupperware. Não posso ficar aconselhando minhas crias. Era demais: o pavor tomou conta de Murphy. Desabou em cima de um grande saco de cimentcola. No dia seguinte, ao recobrar os sentidos, havia um bebê no quintal e a Verruga tinha estourado. Parece que a criança morrera asfixiada pela gosma, por isso todo aquele drama à sua volta, mas também pode ser que não. Ele ainda estava preocupado: tinha guelras, caudas, ventosas, olhos sobressalentes e um torpor esquisito nos ombros. Tirou a camisa e olhou no espelho. Nascia grama em suas costas. Capim. Era impressionante, centenas de tufos botânicos florescendo sob a pele, felizes e verdejantes, mas, pensando bem, agora ele podia dormir de costas no chão. Era preciso aparar o mato todas as quintas-feiras, é verdade, mas até que não era tão ruim assim. As mulheres fazem isso todo mês, nas pernas. Quanto às guelras, acho que me deixam mais acordado, cheio de oxigênio e de boas intenções no Natal. Além do mais, com meu par de ventosas posso segurar melhor as canecas. E conversar de igual pra igual com o meu iguana. As bolhas... bem, elas nascem e estouram todos os dias, só tenho que me lembrar de viver pela manhã e dormir o resto da tarde, sob o ombro esquerdo, para que elas obedeçam com mais facilidade o tal do ciclo diário, e também para que meu olho auricular possa piscar livremente. Talvez essa cauda também sirva pra alguma coisa, daqui a um tempo. Nem tudo é tão ruim na vida, diria a Poliana. No final das contas, acho que sou um homem feliz – não se pode ter tudo neste mundo, é o que continuarei pensando até que cheguem os chineses ou nasça um hediondo par de asas nas minhas omoplatas.
Governo brasileiro estuda uma possível intervenção no Espírito Santo. Porém, o ideal mesmo seria uma intervenção do Espírito Santo no Brasil.
Os suecos não têm despesas com tratamento médico, têm ajuda oficial para tudo e subsídio para o aluguel e recebem tanta assistência que, quando perdem as chaves do carro, se suicidam.
:: O APAGADOR :: No filme La Chinoise, de Jean-Luc Godard, um personagem se vê diante de um quadro-negro em que estão escritos os nomes de todos os principais escritores, compositores, pensadores e artistas da História - e começa a apagá-los, nome por nome, até que sobra só um. O filme é da fase maoísta de Godard e o apagador está fazendo uma espécie de purgação intelectual do personagem, mas a cena sugere um jogo que qualquer um pode jogar, sem comprometimento simbólico. Encha um quadro-negro com todos os nomes que lhe ocorrerem, sem nenhum tipo de ordem. Uma seqüência pode ser, por exemplo, "Heródoto, Nietzsche, São Tomás de Aquino e Charlie Parker", outra "Michelangelo, Villa-Lobos, Steinberg, Marquês de Sade, Platão e Maria da Conceição Tavares". Quando não sobrar espaço no quadro-negro nem para um nome curto ("Meu Deus, esqueci o Rilke!"), comece a apagar. Nome por nome. O importante é não racionalizar. Não estabelecer critério, hierarquia ou ordem. Deixar a apagador fazer seu trabalho sem interferência da sua consciência ou da sua emoção. Apenas ir apagando. Você pode descobrir coisas surpreendentes a seu próprio respeito. Nomes que, até aquele momento, faziam parte da sua galeria de veneráveis se revelarão apagáveis, outros serão poupados até quase o fim. E, no fim, o nome que sobrar, o único nome que você não apagar, poderá ser a maior revelação de todas. Não será, necessariamente, o nome de quem você considera o mais importante, influente, valioso ou simpático da história das idéias ou das artes. Será apenas o nome que, por alguma razão, você não conseguiu apagar. Depois você só precisará se explicar para você mesmo. No filme do Godard, o único
nome que ficava no quadro-negro era o de Brecht.
:: CORRESPONDÊNCIA :: (...) Creio, enfim, que você seja de boa índole, uma vez que cultiva o par de guris chineses para a engorda, ops, para o trabalho com carvão, talvez um dia até possamos intercambiar nossos hóspedes - tenho 8 anõezinhos hindus que passam os dias a embrulhar embalagens de isopor, depois desembrulhá-las e tornar a fazer tudo novamente, dentro de suas respectivas jaulas, sob a orientação de um professor de física caolho (chamado Sísifo), que só vê o lado bom das coisas pois não tem o olho pessimista.
:: VOCÊ PERGUNTA, NÓS
NÃO DAMOS A MÍNIMA :: ...oras! churrasco!
Este Zine é impessoal. Computadores meticulosamente programados desenvolvem os textos, se emocionam, revisam e publicam a visão neutra e imparcial da coisa toda. O único responsável é a instituição "Da Redação".
Você está recebendo o !!DAMN!! Zine porque (oinc!) estava na lista de indivíduos manquitolas da lista negra dos Illuminati. Ou então, ou então! Você está recebendo o !!DAMN!! Zine porque foi um dos 139 mil nomes escolhidos entre todos os possíveis do mundo, sorteados em uma grande urna chinesa. Você e Li-Ching-Yang. Caso não queira voltar a receber este monte de bobagens, mande um e-mail para vmbarbara@brfree.com.br, e escreva na linha de assunto: "Me deixem em paz, pelas barbas de Tutatis!". Se quiser que mais vítimas recebam o Zine, também escreva para esse e-mail mandando o endereço dos condenados e o número e senha de suas contas bancárias. Se quiser usar cartão de crédito, basta fornecer o número. !!DAMN!! Zine - o zine das coisas que foram, das coisas que são o que são, das que não são o que não são e das que poderiam vir a ser o que não foram. Perfeito para forrar o chão de barracas fajutas e para embrulhar mortadela. Parceiro do tablóide norte-americano "O Sol da Meia Noite", mas não olhe pra trás porque tem um fauno fritando ervilhas nas suas omoplatas. "Em verdade, em verdade vos digo: Aquele que ri cuidado para que não babe".
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2005
Vanessa Barbara |