Sessenta e nove longos outonos
e a rainha dos patês continuava de joelhos no piso da sala,
velando um pote turvo de maionese. Assim não dá, murmurou
a faxineira russa, e nós chacoalhamos a cabeça vagamente
sem afastar os olhos do piso de bolinhas. (...)
:: CULTO SATÂNICO, TUDO BEM ::
... mas um pato?!
(...) Em 1986 Nadean Cool, uma ajudante de enfermagem em Wisconsin,
procurou ajuda terapêutica de um psiquiatra para auxiliá-la
a superar um evento traumático experimentado pela filha. Durante
a terapia, o psiquiatra usou hipnose e outras técnicas sugestivas
para trazer à tona recordações de abuso que Cool
supostamente teria experimentado. No processo, Cool foi convencida
de que tinha memórias reprimidas de ter estado em um culto
satânico, de comer os bebês, de ser estuprada, de ter
sexo com animais e de ser forçada a assistir o assassinato
da sua amiga de oito anos. Ela chegou a acreditar que teve mais de
120 personalidades – crianças, adultos, anjos e até
mesmo um pato.
(....)
:: ESTÁ VENDO AQUELE
GRAAANDE PRÉDIO DE CHOCOLATE? ::
por Franz Kafka
Você deve apenas mudar a direção, disse o gato
e o devorou.
:: DAR UMA VOLTA, EMBEBEDAR-SE, PECAR EM GERAL ::
da revista Kapa
Confrontados com o baixo nível das conversas da juventude portuguesa,
decidimos dar o nosso contributo. Compreendemos que ninguém
tem tempo e que, quando o há, temos coisas mais engraçadas
que fazer do que ler um livro, por muito bom que ele seja. Ver vídeos,
dar uma volta, embebedar-se, pecar em geral, são de facto actividades
mais divertidas e mais rápidas.
Por esta e outras razões pomos a nossa extensa cultura ao serviço
de todos os ignorantes que nos lêem. Para poupar tempo e dinheiro
aqui estão alguns tesouros da literatura universal em poucas
linhas e ao alcance de qualquer besta.
Marcel Proust, À Ia recherche du temps perdu.
Resumo: Um rapaz asmático sofre de insónias porque a
mãe não lhe dá um beijinho de boas-noites. No
dia seguinte (pág. 486. I vol.), come um bolo e escreve um
livro. Nessa noite (pág. 1344. VI vol.) tem um ataque de asma
porque a namorada (ou namorado?) se recusa a dar-lhe uns beijinhos.
Tudo termina num baile (vol. VII) onde estão todos muito veIhinhos
e pronto.
James Joyce, Ulysses.
Resumo: Um dia na vida de um judeu chamado Bloom que vai cagar no
primeiro capítulo. Um estudante chamado Daedalus masturba-se
na praia. O judeu bebe uns copos e fala com o sapato. A mulher do
judeu (que é cantora) lembra-se de como fornicou o dia todo
com o seu amante. Termina com a palavra «Sim», prova indiscutível
de que se trata de um livro inteiramente positivo.
Leão Tolstoi, Guerra e Paz (1800 páginas).
Resumo: Um rapaz não quer ir à guerra e por isso Napoleão
invade Moscovo. A rapariga casa-se com outro. Fim.
Luís de Camões, Os Lusíadas.
Resumo: Um poeta com insónias decide chatear o rei e contar-lhe
uma história de marinheiros que, depois de alguns problemas
(logo resolvidos por uma deusa porreiraça), têm o justo
prémio numa ilha cheia de gajas boas.
Gustave Flaubert, Madame Bovary (378 páginas).
Resumo: Uma dona de casa engana o marido com o padeiro, o leiteiro,
o carteiro, o homem do talho, o merceeiro, e um vizinho cheio de massa.
Envenena-se e morre.
William Shakespeare, Hamlet.
Resumo: Um príncipe com insónias passeia pelas muralhas
do castelo, quando o fantasma do pai lhe diz que foi morto pelo tio
que dorme com a mãe, cujo homem de confiança é
o pai da namorada que entretanto se suicida ao saber que o príncipe
matou o seu pai para se vingar do tio que tinha matado o pai do seu
namorado e dormia com a mãe. O príncipe mata o tio que
dorme com a mãe, depois de falar com urna caveira e morre,
assassinado pelo irmão da namorada, a mesma que era doida e
que se tinha suicidado.
Anónimo colectivo, Antigo Testamento (2 vol.)
Resumo: A mesma história tem dezenas de versões. Trata-se
da saga de uma família através de várias gerações.
Uma história de poder, luxúria, paixões incandescentes,
ambições desmedidas, crimes hediondos e sexo.
Anónimo colectivo. Novo Testamento (4 versões)
Resumo: Uma mulher com insónias dá à luz um filho
cujo pai é uma pomba. O filho cresce e abandona a carpintaria
para formar uma seita de pescadores. Por causa de um bufo, é
preso e morre.
:: DA CARTILAGEM COMO OBSESSÃO PESSOAL ::
por Tolstoi
Mal desembarcou do trem, o primeiro rosto que encontrou foi o do marido:
“Meu Deus! Por que lhe terão crescido tanto as orelhas?”,
pensou ela, mirando-lhe a arrogante e fria figura e sobretudo as cartilagens
das orelhas, que lhe chamavam agora a atenção, nas quais,
dir-se-ia, vinham pousar as abas do chapéu.
:: "NICOLE KIDMAN É SALVA POR GARÇOM ASTUTO"
::
de elfos, sabedoria e repartições públicas
Isto de levantar cedo, pensou, estupidifica uma pessoa.
:: JULIO IGLESIAS TIRA O SAPATO EM CADEIA NACIONAL ::
empregos úteis, conseqüências funestas
(...) Confuso, o cantor olhava para o piso de bolinhas enquanto a
apresentadora lhe dirigia uma pergunta sobre o plantio das hortênsias.
Vácuo: nada de resposta. Quando ela já estava desistindo
e ia chamar os comerciais, “Você acha que meus pés
são grandes?” – silêncio, olhares estranhos,
Julio, querido, o senhor não respondeu minha pergunta, “Meus
dedões, acho-os desproporcionais”.
Ele tinha os olhos enormes e olhava com piedade para a platéia.
“Meus pés deveriam ter um terço do tamanho do
meu antebraço menos dois, os gregos tinham razão, alguém
tem uma fita métrica?”
Tá, chega.
:: NÃO ESTOU IMAGINANDO. NÃO ESTOU IMAGINANDO.
NÃO EST ::
não há nada lá fora, apenas grilos e pernilongos
"Peças íntimas de Michael Jackson são usadas
pela polícia"
:: APELO ::
porque os portugueses é que são legais (por um cara chamado
Jorge)
Exmo(a) Senhor(a)
Caso seja um(a) caçador(a) de talentos à deriva pela blogosfera,
quero pedir-lhe o obséquio de me descobrir (caso não o
sejas, pira-te e não me chateis. Chô!). Tenho um emprego
aborrecido e mal pago, o chefe não me compreende e estou ali
a esvair-me em horas que o mundo agradeceria, estivesse eu cumprindo
o meu destino de artista. Eu nasci para o Belo e para a Arte e estou
atascado na pocilga da rotina administrativa, um tecido fino feito emplastro.
Sou um diamante em bruto pronto a ser lapidado por quem me descobrir.
Vasco da Gama (é o seu nome, não é?), serei o seu
Cabo da Boa Esperança!
Repare na minha prosa, de humor fino e olhar canalha. Contemple como,
qual Zelig, me mimetizo na opinião comum ou, quando necessário,
sintetizo em frases displicentes idéias geniais de alma, disparatadas
de aparência. Aprecie a inteligente distribuição
de erros, apoiada numa invisível estrutura iniciática
que lhe dá sentido mas que só é notada por mentes
superiores, como a sua! Descubra-me, e terá aos seus pés
a rota das especiarias!
Descubra-me, porra!
:: SERENADING A MULE ::
intervalo exigido por lei
There's a light in her eye,
Tho' she may try to hide it,
She cannot deny,
there's a light in her eye.
:: SIM, QUERIDO, ESTOU PRESTANDO ATENÇÃO ::
por Tolstoi
“Seja como for, é um homem bom e justo, de bom coração
e notável no seu meio”, dizia Ana para si mesma, ao regressar
aos seus aposentos, como se o defendesse diante de alguém que
o acusava e dissesse ser impossível amá-lo. “Mas
por que razão lhe sobressaem tanto as orelhas? Teria cortado
o cabelo?”
:: BREVE EXPLICAÇÃO ::
De Bias pra frente, é tudo decadência
Esta é uma edição vagamente especial em homenagem
ao senhor-que-parece-um-elfo, com suas orelhas grandes e literatura
confusa. “De Kafka pra frente é tudo pop”, diria
a sutil Tatiana, folheando distraidamente um pergaminho que pertenceu
a Confúcio durante aula de Jornalismo Básico MCMLVIII.
:: DESISTA ::
auto-ajuda de Franz Kafka
"De mim você quer saber
o caminho?" "Sim", eu disse, "uma vez que eu mesmo
não posso encontrá-lo". "Desista, desista",
disse e virou-se com um grande ímpeto, como as pessoas que
querem estar a sós com seu riso.
:: CONVERSA IDIOTA ::
da arte de lavar o cabelo na pia, no meio do expediente
ela = então, ele é da SAM...
eu = ...ãhm?
ela = SAM, Sociedade Amigos do Mandaqui.
eu = e o que é isso?
ela = uma sociedade.
eu = tá, mas o que eles fazem?
ela = pelo que eu sei... nada.
:: NENÚFARES ::
tá. Como é que ele não engasga?
Canta uma esperança desatinada para que enfureçam silenciosamente
os cadáveres dos afogados
Canta para que grasne sarcasticamente o corvo que tens pousado sobre
tua omoplata atlética
Canta como um louco enquanto teus pés vão penetrando
a massa sequiosa de lesmas
Canta! para esse formoso pássaro azul que ainda uma vez sujaria
sobre o teu êxtase.
(...)
Dança, ó desvairado! Dança pelos campos aos rinchos
dolorosos das éguas parindo
Mergulha a algidez deste lago onde os nenúfares apodrecem e
onde a água floresce em miasmas
Fende o fundo viscoso e espreme com tuas fortes mãos a carne
flácida das medusas
E com teu sorriso inexcedível surge como um deus amarelo da
imunda pomada.
(...)
Transforma-te por um segundo num mosquito gigante e passeias de noite
sobre as grandes cidades
Espalhando o terror por onde quer que pousem tuas antenas impalpáveis.
Suga aos cínicos o cinismo, aos covardes o medo, aos avaros
o ouro
E para que apodreçam como porcos, injeta-os de pureza!
E com todo esse pus, faz um poema puro
E deixa-o ir, armado cavaleiro, pela vida
E ri e canta dos que pasmados o abrigarem
E dos que por medo dele te derem em troca a mulher e o pão.
Canta! canta, porque cantar é a missão do poeta
E dança, porque dançar é o destino da pureza
Faz para os cemitérios e para os lares o teu grande gesto obsceno
Carne morta ou carne viva — toma! Agora falo eu que sou um!
:: SUÍNOS SÃO AMIGOS ::
informativo excepcional
Pedimos desculpas pelo poema anterior e aproveitamos para rogar aos
leitores que tenham um grau mínimo de compaixão pela
nossa miséria. “Estou parecendo a Xuxa depois de tomar
uma surra dos duendes”, declarou um de nossos redatores, martelando
a parede [como sempre] de forma gratuita.
Aproveitamos para pedir incentivo financeiro para a pesquisa acadêmica
que vem ocupando os monges-copistas deste <pejorativo>jornalzinho</sarcástico>
nas últimas cinco semanas, e que pretende provar, com rigor
científico, a tese extraordinariamente inédita de que
os suínos não são porcos.
Repetindo: os suínos não são porcos.
:: “COVINHA DE RICKY MARTIN É SUCESSO NA ALEMANHA”
::
Últimas notícias
Moscas gigantes roem celebridades em coquetel de lançamento
Na última sexta-feira, dia 19,
personalidades globais reuniram-se para prestigiar o lançamento
do longa-metragem “Desta Vez Não Será Ridículo”,
estrelado pelas maiores estrelas do cinema tupiniquim. Estiveram presentes
os novos-ricos Fifi Guimarães, Otavinho “Dudu”
Mascarenhas, Carol Ann Figueiredo e Posêidon (novo nome de Patti
Vasconcellos, segundo aconselhamento do numerologista/quiroprata da
família).
Na festa, famosos e emergentes divertiram-se a valer na maior piscina
de bolinhas da América Latina e garantiram que, desta vez,
o filme não será ridículo. O destaque do evento
ficou para a pequena Apnéia, filha de Regininha Ula-Ula e Otavinho
“Dudu” Mascarenhas (ou Juju Marcondes, ou ambos). A adocicada
criança dançou ao som do hit “Intestino Grosso”
e lançou uma torta-merengue de limão na testa do autor
da novela ‘E Eu Com Isso’, para delírio dos fãs.
Outro momento de comoção e espiritualidade ocorreu quando
a modelo-atriz-jornalista-e-escritora Renata Lombardi engoliu uma
bolinha e teve de ser socorrida às pressas pelo galã
Neco Astolf III, que interpreta um paramédico na novela das
oito.
Quando o final da festa já se aproximava e o seu Palhares,
da manutenção, se punha a empilhar cadeiras e varrer
o pé das celebridades (resmungando Malditos Comunistas Vão
Ver O Que É Bom Quando Vier a Bomba), os atores tiveram uma
grande idéia - decidiram se abraçar e cantar, em uníssono,
o hino de Guiné-Bissau. Muitos jornalistas ficaram alvoroçados
e choraram copiosamente, acotovelando-se com carinho. Na saída,
todos ganharam belas lembrancinhas confeccionadas pela estilista-top-produtora-atriz-e-puta
Alicinha Gomide, que vestia um modelito superdecotado nas cores verde,
verde-musgo e verde-calção.
Só então as celebridades foram cruelmente atacadas por
um enxame de moscas mutantes, pegajosas e autolimpantes -- que só
queriam a garantia de que não fosse, mais uma vez, ridículo.
:: TÉCNICO SANDÁLIAS ::
Tipo "Havaianas"
Precisa-se para tempo integral ou assistência. Cartas a/c deste
jornal sob sigla SANDÁLIAS.
[é engraçado - chegar
um cara no meio da noite e tocar a sua campainha, daí você
abre a porta e ele diz: SANDÁLIAS.]
:: CORRESPONDÊNCIA 7.666
/ 03 ::
interceptados por um pacato nenúfar, que declarou inocência
Fico feliz em saber que você ainda (AINDA) não bateu
em ninguém da sua turma, principalmente usando o espremedor
de batatas, porque sempre espremem a minha cabeça com esses
aparelhos e dói, pois acho que você deveria manter o
seu cônjuge trancado no chiqueirinho enquanto você vai
estudar para ele não comer margarina direto do pote (sempre
me trancavam no chiqueirinho da perua escolar porque eu mordia os
outros) e pra ele não machucar os vizinhos idosos e os imaginários,
a propósito, vou visitar vocês depois do dia 15 porque
antes tenho a minha colação, que é uma coisa
obrigatória relativa a grudar minhas duas orelhas com cola
atrás da nuca ou sobre a nova Superbonder, provavelmente eles
vão me bater como sempre mas isso é normal e eu guardo
um pouquinho de pele não-roxa pra vocês usarem em suas
experiências genéticas, como da última vez em
que plantaram um tornozelo nas minhas costas e agora posso jogar futebol
com os meninos.
:: “LÉO ÁQUILA FAZ ALONGAMENTO NOS CABELOS”
::
mais sanidade pública
Você já percebeu *algo* de errado com os carteiros?
(primeiro, eles se vestem de amarelo)
Nas últimas semanas, tive um que - aposto - roubava todas as
cartas que vinham do Japão para a minha vizinha e as estocava
na casa de campo dele em Connecticut, como o cara que gosta de nadar
em pipoca, apesar daquele rostinho inocente que não me engana,
não senhor. Agora chegou um carinha novo que é igualzinho
ao Louis Armstrong e grita CORREEEÊIO de casa em casa, com uma
voz muitolouca e um sorriso entortado para o canto esquerdo –
agora me diga se não é suspeito, me diga se eu não
devo cutucá-lo com um espeto de metal e amaldiçoar toda
a prole do sujeito em latim. Daí eu pensei que, se alguém
estivesse no topo da Conspiração (corra! troque de nome!
adote um bigode e não diga BATATAS), seriam os carteiros, que
são organizadíssimos e até conseguiram exterminar
totalmente a classe dos leiteiros, que também tinham altas
ambições.
:: HOMEM TENTA COMER O PRÓPRIO PESO EM PIPOCAS ::
triste fim de uma cultura coerente
Ora, não me venha com meias palavras, Britney! Se o bom e leal
Arantes tem problemas, eu quero saber -- não me esconda nada,
eu lhe peço!
Jim Bob está escrevendo uma nova novela. Ele se recolheu a
New Hamphesthershire para pensar melhor. Tolinho, pensa em acabá-la
no verão...